Alemães Tentaram Fundar Utopia em Galápagos nos Anos 30

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As icônicas ilhas Galápagos, situadas no litoral do Equador e banhadas pelo Oceano Pacífico, são palco de narrativas memoráveis que redefiniram o entendimento humano. Contudo, em meio a relatos conhecidos, como os de Charles Darwin e sua teoria da evolução por seleção natural, surge uma trama menos divulgada: a tentativa audaciosa de um grupo de alemães em fundar uma utopia nos anos 1930, em uma história que serviu de inspiração para o recente filme “Éden”, dirigido por Ron Howard, premiado por obras como “Uma Mente Brilhante” (2001).

Muito antes das aventuras de piratas ou das escalas de marinheiros em busca das célebres tartarugas, uma série de eventos dramáticos transformou o arquipélago. Esta narrativa em particular se desenrola na década de 1930 e envolveu famílias e casais europeus que desembarcaram na ilha Floreana com a ambição de estabelecer ali uma “utopia tropical”. Tal complexidade de enredos sobre dedicação, desilusão, drama e até momentos de humor, despertou o interesse de Howard.

Alemães Tentaram Fundar Utopia em Galápagos nos Anos 30

Os personagens centrais dessa saga alemã em Galápagos incluem a autoproclamada baronesa Eloise Bosquet de Wagner Wehrhorn, o médico e filósofo Friedrich Ritter, sua esposa Dore Strauch Ritter, e o casal Heinz e Margret Wittmer. Entre 1929 e 1932, esses indivíduos chegaram à ilha desabitada, motivados por propósitos variados: alguns vislumbrando a criação de uma colônia experimental, outros buscando um refúgio idílico para descanso. Contudo, os confrontos emergentes entre eles logo transformariam o sonhado paraíso em um pesadelo implacável. Howard descreveu a experiência como “uma ideia fascinante”, repleta de “suspense, traição, violência, tragédia, mas também humor e nobreza”, elementos vividos no cenário natural das Galápagos de Darwin.

O Legado de Darwin e a Crise Alemã Impulsionam Migração

Após a publicação da revolucionária teoria da evolução de Darwin em “A Origem das Espécies” (1859), as Galápagos ascenderam ao status de lenda, atraindo tanto pesquisadores quanto curiosos da Europa. A Alemanha de 1929 enfrentava uma profunda crise econômica, empurrando muitos de seus cidadãos a buscar alternativas para subsistência ou novos horizontes. Nesse contexto, Friedrich Ritter, um médico com grande apreço pela filosofia, especialmente pelas ideias de Friedrich Nietzsche sobre o Übermensch (o super-homem), buscava um local para aplicar sua visão de vida alternativa. Em 1929, Ritter conheceu Dore Strauch, cuja saúde melhorou significativamente sob seus tratamentos. A paixão surgiu, apesar de ambos serem casados. Relatos de Strauch, em seu livro “Satã Visitou o Éden”, indicam que ambos decidiram fugir da Alemanha para Floreana, um lugar onde a disciplina e determinação poderiam forjar o ideal nietzschiano, ironicamente, na mesma ilha onde Darwin observou a sobrevivência do mais forte. Um detalhe excêntrico de sua preparação foi a remoção dos próprios dentes para evitar problemas dentários em seu exílio remoto.

Pioneiros na Ilha Floreana e o Início dos Atritos

Friedrich Ritter e Dore Strauch estabeleceram-se na ilha em setembro de 1929, dedicando-se a transformar a paisagem inóspita em um lar para suas filosofias. Logo depois, movidos por notícias na imprensa alemã sobre as proezas do casal, Heinz e Margret Wittmer chegaram a Floreana. A motivação principal para os Wittmer foi a busca de um clima mais favorável para a asma de seu filho. Margret Wittmer também imortalizaria suas experiências em “Agência de Correios de Floreana: uma vida extraordinária de uma mulher no fim do mundo”. Seus relatos, assim como os de Strauch, indicam que, apesar de não cultivarem laços de amizade profunda e de existirem tensões latentes, a coexistência das duas famílias na ilha se deu sem grandes problemas por um período.

O cenário, no entanto, mudaria drasticamente com a chegada da baronesa Eloise Bosquet de Wagner Wehrhorn, uma figura excêntrica de origem austríaca que se autodenominava nobre, acompanhada por dois amantes. Sua presença marcaria o início dos verdadeiros conflitos.

Ascensão das Tensões e Desaparecimentos Misteriosos

A visão de Eloise Bosquet para Floreana contrastava agudamente com os ideais dos pioneiros alemães. Enquanto Ritter e Strauch perseguiam uma existência de disciplina filosófica, a baronesa planejava construir um luxuoso hotel para atrair turistas e oferecer-lhes os prazeres e paisagens locais. Essa oposição ideológica foi amplificada por condutas agressivas. A baronesa utilizava os recursos escassos, meticulosamente organizados pelas outras famílias, de forma desproporcional. A ideia de um resort também se chocava com o estilo de vida que os casais visavam. Para agravar, Bosquet interceptava e reescrevia as correspondências destinadas à imprensa alemã, centralizando a si mesma na narrativa divulgada, um fato explorado no documentário de 2013, “O Caso Galápagos: Quando Satã Veio ao Paraíso”, dos cineastas Daniel Geller e Dayna Goldfine.

Alemães Tentaram Fundar Utopia em Galápagos nos Anos 30 - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

As tensões escalaram rapidamente, com os dois primeiros casais expressando abertamente o desconforto com os alegados abusos da baronesa e seus amantes. Rudolph Lorenz, um dos amantes da baronesa, demonstrava sua insatisfação com Strauch e com a vida na ilha. Simultaneamente, as agruras da vida remota começavam a deteriorar o casamento entre Friedrich Ritter e Dore Strauch. Floreana, longe de ser o paraíso sonhado, transformava-se num purgatório.

No dia 27 de março de 1934, um episódio perturbador abalou a ilha: a baronesa e seu amante, Robert Philipson, desapareceram sem deixar vestígios. As versões de Dore Strauch e Margret Wittmer são conflitantes: Wittmer sustentou que a baronesa embarcou num navio para o Taiti, embora nenhuma investigação tenha encontrado provas dessa travessia. Strauch, por sua vez, relatou ter ouvido um grito na noite anterior ao desaparecimento e nunca ter visto qualquer embarcação nas proximidades. Apenas os pertences da baronesa foram encontrados em sua residência. A tragédia se aprofundou quando o outro amante da baronesa partiu pouco depois, supostamente para a ilha de São Cristóvão, mas meses mais tarde, seu corpo mumificado foi descoberto na ilha de Marchena, em direção oposta ao seu destino original. Uma última fatalidade menos misteriosa ceifaria Friedrich Ritter, que morreu poucos meses após os desaparecimentos, em decorrência do consumo de frango estragado. Com a morte de Ritter, Dore Strauch decidiu retornar à Europa.

O Legado de Floreana: Um Hotel e a Persistência

Os únicos sobreviventes daquela notável e trágica aventura foram Heinz e Margret Wittmer. Com resiliência, eles persistiram em Floreana, estabelecendo um hotel que seria mantido pela família por anos. Margret Wittmer, a última testemunha e sobrevivente entre todos os envolvidos nesta dramática saga, veio a falecer no ano 2000. Sua história, assim como a dos outros pioneiros, continua a fascinar, revelando a complexidade da natureza humana diante do isolamento e das adversidades extremas.

A intrigante saga dos colonos de Floreana se desenrolou no mesmo palco natural que inspirou um dos mais revolucionários pensamentos científicos da história: a Teoria da Evolução pela Seleção Natural. Para aprofundar seu conhecimento sobre esse marco fundamental, que explica como espécies prosperam ou perecem no ambiente, você pode consultar o artigo detalhado em A Origem das Espécies na Wikipedia.

Essa é uma das muitas histórias complexas de pioneirismo e desilusão que o arquipélago de Galápagos testemunhou, um lembrete vívido dos desafios e conflitos que podem surgir mesmo nos mais belos dos paraísos. A experiência dos alemães em sua utopia frustrada é um conto fascinante sobre ambição, idealismo e a inevitabilidade das interações humanas. Continue explorando narrativas que revelam as profundas conexões entre ambições humanas e contextos históricos em nossa seção de Análises.

Crédito: Doheny Library Collection da USC


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