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Washington, D.C., foi palco de intensos debates políticos na semana de 9 de setembro de 2025, com a realização simultânea de duas importantes reuniões que refletiram as divisões ideológicas do país. As Conferências Abundance e NatCon, embora opostas em suas plataformas centrais, provocaram reflexões profundas sobre o papel da regulação e o futuro da América. O jornalista sênior Tina Nguyen, do veículo The Verge, através de sua coluna “Regulator”, destacou a relevância desses eventos que capturaram a atenção dos formuladores de políticas na capital norte-americana.
De um lado, a Conferência Abundance, realizada no elegante Salamander Hotel à beira-mar, reuniu defensores de uma “tecno-utopia” americana. A premissa fundamental desse grupo, marcadamente otimista, é que a prosperidade e o progresso podem ser alcançados se o governo diminuir significativamente sua intervenção regulatória. No polo oposto, a Conferência NatCon, no Westin DC Downtown, foi um encontro de oficiais e aliados de uma gestão política anterior, pautado por um discurso de endurecimento e controle.
Conferências Abundance e NatCon: Debate Crucial sobre a Regulação
O foco da NatCon esteve na promoção de medidas mais rígidas. Dentre as propostas discutidas, sobressaíam a perseguição de desenvolvedores de Inteligência Artificial e a exclusão daqueles considerados “insuficientemente americanos”, apontando para um tom de linha-dura. Paralelamente, embora a NatCon geralmente pregoasse menos regulação, apresentava uma notável exceção: defendia intervenções estatais robustas em áreas específicas, como o controle rigoroso da Inteligência Artificial e da tecnologia, bem como uma política imigratória de “prejuízo extremo”, indicando uma contradição pragmática em seu apelo à desregulação geral. Este contraste evidenciou que a demanda por “menos” ou “mais” regulação dependia criticamente da área em questão e da agenda política defendida por cada lado. No entanto, Gaby Del Valle, repórter de política do The Verge, percebeu que, apesar das discrepâncias, ambas as conferências articulavam a mesma questão central: o futuro da América em termos de provisão e recursos, e para quem esses recursos se destinam.
Os Ideais Anti-Regulação da Conferência Abundance
A Conferência Abundance destacou-se por sua visão expansionista e sua crença na possibilidade de abundância para todos, defendendo que o principal obstáculo para esse cenário seria a regulação. Tina Nguyen, em diálogo com Gaby Del Valle, descreveu o Abundance como a perspectiva de que “precisamos de mais de tudo e que podemos ter mais de tudo, e que o que nos impede de ter mais de tudo é, na verdade, a regulamentação”. Um pilar central dessa filosofia deriva do movimento YIMBY (“Yes In My Backyard” – “Sim no Meu Quintal”), que promove a construção de mais moradias e confronta o sentimento NIMBY (“Not In My Backyard” – “Não no Meu Quintal”), característico de comunidades que resistem ao desenvolvimento em suas vizinhanças. Regulamentos locais, como exigências sobre escadas em edificações, foram citados como exemplos concretos de barreiras à expansão habitacional. Essa abordagem ecoava as discussões presentes em obras de Ezra Klein e Derek Thompson, que exploravam visões de um futuro em que tecnologias avançadas, como a “medicina das estrelas” entregue por drones, seriam acessíveis a todos, não apenas aos mais ricos.
A argumentação liberal em torno da Abundance sugere uma reavaliação do propósito da regulação. Historicamente, regimes regulatórios surgiram para conter um capitalismo irrestrito que resultou em degradação ambiental, poluição e abusos trabalhistas, tornando a vida das pessoas mais saudável, segura e melhor. Contudo, os proponentes da Abundance agora questionam se essa mesma regulação, em sua forma atual, não estaria na verdade freando o progresso e impedindo uma melhoria contínua da qualidade de vida. Nesse contexto, a Abundance demonstrou ser uma plataforma ideologicamente diversa, copatrocinada por grupos de centro-esquerda e de direita moderada. Embora fosse majoritariamente composta por liberais preocupados com a carga regulatória, havia socialistas e membros de instituições como a Foundation for American Innovation, um think tank de centro-direita, presente. Isso indicava uma realignação em algumas correntes políticas, especialmente entre grupos liberais que historicamente defendiam um estado regulatório robusto.
O Posicionamento Contrário da Conferência NatCon
Em contraste direto com a Abundance, a NatCon se estabeleceu como uma reunião da extrema-direita. A conferência foi sarcástica e apropriadamente denominada “Conferência da Escassez” pela ex-escritora da The Atlantic, Jerusalem Demsas, em observação compartilhada por Gaby Del Valle. Os discursos da NatCon sublinhavam uma visão de nação já “cheia” e focada na ideia de “quem pertence” e como os recursos deveriam ser exclusivamente distribuídos para “americanos”. Um exemplo marcante dessa retórica foi o discurso do Senador Eric Schmitt, do Missouri, que argumentou que os antepassados lutaram pela nação “não para todos os outros”, citando inclusive a luta contra “bandos de guerra indígenas” para destacar o nacionalismo acirrado. Esta narrativa sublinhava a importância de definir e proteger os “americanos” contra uma série de “ameaças”, incluindo a Inteligência Artificial, o aborto e a imigração, pintando um cenário de fronteiras culturais e físicas em risco. Tal posição divergia profundamente dos debates mais matizados observados na Abundance, onde, por exemplo, o tema da imigração era focado na reforma de vistos para profissionais qualificados (como o sistema H-1B) em vez de uma proibição categórica.
Enquanto a Abundance discutia como prover para uma população existente e crescente, a NatCon concentrava-se em quem era elegível para esses recursos, demarcando estritamente os contornos da identidade americana. Além disso, a NatCon era caracterizada por uma postura marcadamente “anti-livre comércio”, “pró-tarifas”, e “pró-controle de tecnologia”. Era uma reunião com pouca abertura ao diálogo bipartidário, priorizando uma comunicação com “muita emoção e pouca política”, contrastando com o perfil “muita política e pouca emoção” da Abundance, conforme análise de Gaby Del Valle. Esta distinção crucial revelava abordagens muito diferentes sobre como as agendas seriam vendidas ao público, com a NatCon apelando mais à emoção e ao sentimento de pertencimento do que a argumentos técnicos ou propostas políticas detalhadas.

Imagem: Haein Jeong/The via theverge.com
O contraste se estendia até mesmo ao papel da IA. Enquanto alguns participantes da Abundance discutiam os riscos da inteligência artificial, eles geralmente eram abertos à ideia de que a IA poderia, de fato, melhorar a vida das pessoas. Não havia, na visão dos presentes na Abundance, a conversa sobre o advento de “Satanás” que alguns esperariam de visões mais apocalípticas sobre o futuro tecnológico, em linha com algumas perspectivas conservadoras extremas vistas na NatCon. As discussões na Abundance sobre IA eram muito mais sobre “como introduzir alguma fricção em suas vidas”, mostrando um pensamento mais nuançado. O consenso predominante favorecia uma abordagem otimista e pragmática à inovação tecnológica. Essa busca por otimizar políticas de desenvolvimento tecnológico, por exemplo, é um dos desafios da regulamentação moderna, buscando equilibrar inovação e controle.
O Eixo Comum das Discussões: O Futuro Americano
Apesar das profundas divergências, a teoria articulada por Gaby Del Valle – de que as duas conferências, no fundo, faziam as mesmas perguntas sobre o futuro dos Estados Unidos – revelou um denominador comum subjacente. A NatCon se perguntava “quantos recursos temos e são eles apenas para os americanos, e quem é americano?”. A Abundance, por sua vez, questionava “temos todas essas pessoas aqui, o que fazemos para garantir que essas pessoas tenham o suficiente de tudo?”. Temas como o custo de vida e a construção de mais moradias foram amplamente discutidos, como evidenciado pela participação do governador de Utah, Spencer Cox. Houve até painéis dedicados à “Abundance na família”, explorando como políticas e culturas poderiam encorajar a natalidade, indicando um interesse em fomentar o crescimento demográfico sob novas bases.
Ambas as conferências, cada uma à sua maneira, lutavam com a comunicação de suas ideologias. Enquanto a NatCon era mais sobre “vibrações”, sem um plano de políticas coerente e detalhado, a Abundance era sobre “política pura”, com pouco apelo emocional. Essa distinção ressaltava o desafio da comunicação política: vender ideais complexos ao público. A Abundance buscava maneiras de “entregar utopianismo através de white papers” e pensava em estratégias para apresentar suas conquistas. A Tina Nguyen ainda aponta para uma reflexão sobre a experiência de campanhas políticas passadas que se apoiavam excessivamente na explicação de ideias, em vez de se conectarem de forma mais acessível com a população.
Em suma, as Conferências Abundance e NatCon representaram os espectros opostos do debate político americano, abordando questões existenciais sobre recursos, identidade e o papel do governo no avanço ou restrição do progresso. As visões e as propostas apresentadas oferecem um vislumbre das tensões e potenciais realinhamentos em curso na paisagem política, delineando estratégias diversas para moldar o futuro da nação. Para aprofundar a compreensão das tendências políticas e econômicas que influenciam esses debates, continue acompanhando nossas análises detalhadas na editoria de Política e mantenha-se informado sobre os acontecimentos que definem nosso país.
Crédito da imagem: Haein Jeong / The Verge
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