Ana Helena Ulbrich: Da NoHarm à Lista Time de IA para o SUS

noticias
Artigos Relacionados

📚 Continue Lendo

Mais artigos do nosso blog

A ascensão da Ana Helena Ulbrich na lista dos cem mais influentes no campo da Inteligência Artificial (IA) da revista Time marca um ponto significativo para o Brasil no cenário tecnológico global. A farmacêutica gaúcha foi reconhecida não por uma busca incessante por fortuna, mas por um propósito social: oferecer uma solução inovadora para o Sistema Único de Saúde (SUS) que otimiza a segurança de pacientes através da análise de prescrições médicas, sem visar lucros bilionários como outros nomes da mesma lista.

No início deste mês, a Time, uma das mais influentes publicações americanas, divulgou sua aguardada lista inaugural com os cem indivíduos mais influentes no ecossistema da inteligência artificial. Entre figuras amplamente conhecidas do setor, como Elon Musk (Tesla, xAI), Sam Altman (OpenAI, ChatGPT) e Mark Zuckerberg (Meta), e também o brasileiro Cristiano Amon (CEO da Qualcomm), a presença de Ana Helena Ulbrich destaca-se pela natureza distinta de seu empreendimento.

Ana Helena Ulbrich: Da NoHarm à Lista Time de IA para o SUS

Ao contrário dos empresários cujas inovações frequentemente se traduzem em vastas riquezas e catapultam companhias a valores de mercado estratosféricos — a NVidia, por exemplo, atingiu mais de US$ 4 trilhões de valor –, Ana Helena Ulbrich e seu irmão, o cientista de dados Henrique Dias, seguiram um caminho alternativo. Ambos, moradores de Capão da Canoa, no litoral norte do Rio Grande do Sul, conceberam uma ferramenta de IA dedicada a mitigar erros em prescrições médicas no Brasil, mas o fizeram através de um instituto sem fins lucrativos, o NoHarm.

Localizada na incubadora de negócios Tecnopuc Startup, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), em Porto Alegre, a pequena equipe de 20 pessoas do NoHarm opera com uma missão clara: cobrar uma taxa modesta de hospitais privados para garantir que sua tecnologia seja disponibilizada integralmente e de forma gratuita para unidades hospitalares públicas em todo o país. Ulbrich revelou em entrevista que, “Nós nunca quisemos ser milionários. Não tínhamos essa necessidade ou essa vontade”, sublinhando a motivação por trás do modelo de negócios não-convencional.

A Problemática das Prescrições Médicas e a Solução NoHarm

A gênese do NoHarm reside em uma problemática rotineira vivenciada por farmacêuticos no sistema de saúde público. Em 2017, Ana Helena Ulbrich trabalhava como farmacêutica no Grupo Hospitalar Conceição, a maior rede de hospitais públicos do Sul do Brasil, totalmente integrada ao SUS. Sua responsabilidade consistia em avaliar a segurança e eficácia das prescrições médicas, um trabalho exaustivo sob condições de tempo extremamente limitadas.

Com apenas um ou dois minutos para analisar cada prescrição e liberá-la, a equipe de Ulbrich, composta por quatro profissionais, chegava a avaliar 800 prescrições diárias. Este ritmo, segundo ela, gerava uma constante insegurança quanto à completude e qualidade das avaliações. Erros em dosagens, interações medicamentosas adversas ou falha em considerar condições específicas de pacientes — como idade avançada, comorbidades ou disfunções renais e hepáticas — são riscos presentes quando o farmacêutico não tem acesso pleno e tempo para analisar o prontuário completo, que inclui informações cruciais de médicos, enfermeiros e resultados de exames.

Em discussões familiares durante almoços de domingo, Ulbrich compartilhou o dilema com seu irmão, Henrique Dias, que na época cursava doutorado em informática na PUC-RS. Essas conversas frutificaram em um projeto de pesquisa focado na detecção de eventos adversos em prontuários hospitalares, resultando no desenvolvimento de um algoritmo que hoje forma a espinha dorsal da NoHarm. Este algoritmo foi desenhado para identificar prescrições medicamentosas fora do padrão, alertando os farmacêuticos sobre potenciais erros.

NoHarm: Desenvolvimento e Impacto no SUS

O algoritmo inicial, embora publicado em revista científica, não preencheu completamente as ambições dos irmãos. Eles aspiravam a criar uma ferramenta prática que verdadeiramente facilitasse o cotidiano dos farmacêuticos hospitalares. Em 2019, o prêmio Lara, concedido pelo Google, forneceu o capital semente para fundar o Instituto NoHarm – um nome sugestivo, que significa “sem danos”.

O primeiro hospital a implementar a solução foi o Hospital Santa Casa de Porto Alegre. O sistema não só incorpora o algoritmo de detecção, mas também integra-se diretamente ao banco de dados do hospital, tendo acesso a todo o prontuário do paciente – desde exames até comorbidades e anotações de diversos profissionais de saúde. A análise da primeira prescrição médica pela plataforma ocorreu em março de 2020.

A NoHarm vai além de meros alertas; ela sugere planos de ação para os farmacêuticos lidarem com os problemas identificados. No entanto, Ana Helena Ulbrich faz questão de frisar que a tecnologia não é um substituto do profissional. Ela é um “suporte à decisão”, uma ferramenta que agiliza o processo de avaliação sem eliminar o crucial olhar humano treinado para a tomada de decisões. “Entendemos que a inteligência artificial, de forma ética, tem que ser assim”, ressaltou a farmacêutica.

A jornada para concretizar o NoHarm exigiu sacrifícios. Os irmãos mantiveram seus empregos originais, dedicando-se apenas parcialmente ao projeto. Ulbrich, inclusive, precisou equilibrar o desenvolvimento da ferramenta com o trabalho árduo no hospital durante a pandemia, além das responsabilidades como mãe de dois filhos.

Ana Helena Ulbrich: Da NoHarm à Lista Time de IA para o SUS - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

A Expansão e o Modelo de Gratuidade no Sistema Público

A experiência no Hospital Santa Casa de Porto Alegre foi um marco de sucesso. A utilização da ferramenta NoHarm possibilitou ao hospital quadriplicar a quantidade de prescrições analisadas com a mesma equipe, comprovando sua eficiência. Sem investir em marketing tradicional, a inovação foi sendo disseminada por Ulbrich em conferências e eventos do setor.

Atualmente, o NoHarm é empregado por 200 hospitais em todo o Brasil, processando mais de 5 milhões de prescrições mensalmente e beneficiando mais de 2,5 milhões de pacientes. Em 2023, Ulbrich e Dias dedicaram-se integralmente à NoHarm, onde todos os recursos arrecadados são reinvestidos na tecnologia, pagamentos de salários e custeio da operação.

A sustentabilidade do instituto provém de editais de fundações privadas e bancos como o BNDES, além da receita gerada pelo licenciamento do sistema para hospitais da rede privada. Para os hospitais do SUS, o acesso é integralmente gratuito – um pilar fundamental e irrenunciável do projeto dos irmãos, e razão primária para a escolha de um modelo sem fins lucrativos.

A experiência com investidores privados não foi positiva. Durante as negociações iniciais, o propósito de ofertar a ferramenta gratuitamente ao SUS colidia diretamente com a lógica de lucro dos investidores, tornando qualquer parceria inviável. Outro diferencial da NoHarm é que sua ferramenta é disponibilizada em código aberto, encorajando o desenvolvimento de plataformas similares e o compartilhamento de conhecimento.

Ulbrich enfatiza o orgulho de não terem cedido à pressão por retornos financeiros. Os recursos obtidos via prêmios e editais de fontes como Google e Amazon garantiram a independência para traçarem seu próprio rumo. Essa decisão, segundo ela, solidificou a reputação da NoHarm e atraiu parceiros que valorizam o propósito de aprimorar o sistema de saúde em detrimento do lucro.

A vitória em editais de fundações de renome, como a Fundação Gates, de Bill e Melinda Gates, foi um fator crucial que Ulbrich atribui à sua nomeação para a influente lista da Time. Essa distinção internacional trouxe à Ana Helena Ulbrich uma agenda ainda mais agitada, com convites para palestras em diversas nações, incluindo Estados Unidos, Egito e Emirados Árabes. Sua maior preocupação continua sendo a ética na IA: a tecnologia deve ser um suporte à decisão humana, sempre explicitando suas referências.

A história de Ana Helena Ulbrich e o NoHarm demonstra como a inteligência artificial, quando orientada por um forte propósito social e princípios éticos, pode gerar um impacto transformador em setores críticos como a saúde pública. Para explorar outros conteúdos que discutem a intersecção entre tecnologia, inovação e impacto social, convidamos você a ler outras análises aprofundadas em nosso portal e continuar acompanhando as tendências que estão moldando o futuro.

Crédito: Divulgação.


Links Externos

🔗 Links Úteis

Recursos externos recomendados

Deixe um comentário