Imigrantes brasileiros nos EUA usam drones contra ICE

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A comunidade de imigrantes brasileiros nos EUA, particularmente em Massachusetts, tem vivenciado um período de intensa apreensão desde o início de setembro. A crescente pressão por parte do Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE), conhecido pelos brasileiros como “gelo”, levou a táticas inovadoras de defesa e comunicação. As redes de mensagens se tornaram canais essenciais para disseminar alertas sobre as operações, incluindo o uso de drones para monitorar a presença de agentes federais, alterando a rotina de milhares de pessoas não documentadas no estado.

Desde o primeiro fim de semana de setembro de 2025, os grupos de WhatsApp, conforme relatado pelo mineiro Júnior e pela mato-grossense Lorena, ficaram sobrecarregados com informações e avisos sobre a atuação do ICE. Esta movimentação culminou com o lançamento da “Operação Patriot 2.0” pelo governo Donald Trump em 6 de setembro, tendo como alvo principal o estado democrata de Massachusetts. Segundo o Instituto Diáspora Brasil, organização local sem fins lucrativos, enquanto cerca de 150 mil brasileiros vivem oficialmente no estado, este número pode facilmente ultrapassar 300 mil ao considerar os não registrados. Diante do cerco, as comunidades têm buscado maneiras criativas de proteção.

Imigrantes brasileiros nos EUA usam drones contra ICE

A Operação Patriot 2.0, focada em Massachusetts, foi deflagrada após um período de relativa calmaria na região metropolitana de Boston, que abriga cidades com forte presença brasileira, como Framingham e Milford. O Departamento de Segurança Interna (DHS) emitiu um comunicado veemente, alertando que “Se você vier ao nosso país ilegalmente e violar nossas leis, nós vamos caçá-lo, prendê-lo, deportá-lo, e você nunca mais voltará”. Esta nova ofensiva, prevista para durar “semanas”, aprofundou a convicção entre os imigrantes brasileiros de que, diferentemente dos meses iniciais da gestão Trump, agora qualquer indivíduo pode ser detido, e não apenas aqueles considerados criminosos. A convicção tem sido alimentada pelas mensagens e experiências compartilhadas nos grupos de WhatsApp, onde os imigrantes não documentados se mostram mais ativos.

Alerta Comunitário e a Vida nos Grupos de WhatsApp

Nas semanas seguintes ao início da operação, grupos de WhatsApp com milhares de membros brasileiros em Massachusetts se tornaram uma linha de frente crucial de comunicação e apoio. As conversas, monitoradas de perto por equipes jornalísticas, revelam a alteração drástica nas rotinas e o clima de apreensão que permeia a comunidade. As manhãs costumam iniciar com informações sobre blitzes do ICE por todo o estado, acompanhadas por imagens de indivíduos detidos e de veículos abandonados na rua – estes últimos, numa tentativa desesperada de que parentes os reconheçam. Lorena Betts, de 37 anos, fundadora de uma rede de voluntários que documenta e filma prisões, descreve a crescente incidência de pessoas que “simplesmente desapareceram” após a detenção, reiterando a importância vital desses grupos.

Betts, que reside legalmente nos EUA após casamento com um cidadão americano e é candidata a deputada democrata em Massachusetts, aponta para a estratégia do ICE de transferir rapidamente os detidos: “Eles prendem em Boston, no outro dia [a pessoa] está Nova York, no outro na Louisiana, porque sabem que no sul dos EUA os juízes dão sentenças mais duras”. Além dos alertas, os grupos são palcos para compartilhamento de angústias e dicas práticas, como evitar sair com crianças ou até mesmo abster-se de falar português em público. Júnior, de 27 anos, um entregador de aplicativo em Lowell e administrador de um dos grupos, conta que desde a Operação Patriot 2.0, os alertas começam religiosamente às 5h da manhã. “É o horário que os agentes estão se reunindo, então o grupo já começa a pipocar com notícias”, explica. Ele criou o grupo quando Trump voltou à presidência, há três anos, visando criar uma rede focada em informações migratórias, ajudando a identificar carros e agentes do ICE que frequentemente atuam disfarçados. Júnior reconhece, porém, a ocasional disseminação de desinformação.

O Posicionamento de Boston e a Reação Federal

A Operação Patriot 2.0 em Massachusetts é interpretada como uma resposta direta do governo Trump à postura da prefeita democrata de Boston, Michelle Wu. Ela se manifestou publicamente contra a escala das blitzes migratórias, reafirmando Boston como uma “cidade-santuário”, que tem como política não cooperar com o governo federal na repressão aos imigrantes. Em contrapartida, o governo federal expressou: “Se Boston não proteger seus cidadãos contra crimes cometidos por imigrantes ilegais, este Departamento de Justiça o fará”. Esta é a terceira onda de operações do ICE no estado em 2025, sucedendo avanços em março e maio. A promessa central de campanha de Trump foi frear a imigração ilegal, justificada por alegações de que a imigração descontrolada estaria “envenenando o sangue” do país, “tomando vagas de emprego” e sobrecarregando os serviços públicos, acusações que são veementemente criticadas por entidades defensoras de liberdades civis, que denunciam a violação de direitos constitucionais.

Desde o retorno de Trump à Casa Branca, o DHS informou que 400 mil pessoas já foram deportadas, incluindo tanto aqueles detidos internamente quanto barrados nas fronteiras. Desse total, aproximadamente 2 mil imigrantes já chegaram ao Brasil em voos de deportação desde fevereiro. Atualmente, o país mantém cerca de 60 mil imigrantes presos em centros de detenção, um recorde comparado aos 39 mil detidos quando Trump assumiu a presidência, com a meta governamental de prender 3 mil imigrantes por dia. Em contraste, a política de Trump também resultou numa redução de 92% no número de imigrantes que conseguem entrar no país pela fronteira com o México em relação ao ano anterior, conforme dados do governo americano.

Drones em Ação: Monitoramento Comunitário

Uma das táticas mais surpreendentes surgiu na terceira semana de setembro: o uso de drones. Mensagens provenientes de um condomínio na região noroeste de Boston, conhecido por abrigar muitos brasileiros, começaram a circular com fotos e vídeos mostrando carros da polícia parados nas saídas e no estacionamento. Por dois dias, os moradores sentiram-se encurralados, receosos de deixar suas casas. Em 16 de setembro, um novo vídeo circulou, exibindo imagens aéreas do condomínio, revelando que os moradores haviam lançado um drone para aproximar a câmera dos veículos parados e verificar a presença de agentes do ICE.

A regulamentação dos EUA permite o voo recreativo de drones com menos de 250 gramas sem registro, contanto que não excedam a altura de 120 metros, embora a conformidade com essas regras por parte dos moradores não tenha sido confirmada. Os imigrantes compartilham em grupos que a própria casa é o único local onde se sentem seguros de serem alvo. Um apelo visualmente impactante, encaminhado via animação, aconselhava a não sair para trabalhar: “Uma semana ou duas sem trabalhar vai ti deixar rico? Qual seria melhor, perder o trabalho e depois consegue outro ou ficar meses trancados em detenção longe dos filhos?”, questionava o cartaz.

Imigrantes brasileiros nos EUA usam drones contra ICE - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

Sem um mandado judicial específico, agentes do ICE não têm permissão para entrar em residências. Geralmente, eles utilizam mandados administrativos para buscar pessoas específicas em locais públicos ou podem realizar abordagens de quem consideram “suspeitos”, detendo-os se identificarem irregularidades. Contudo, em 8 de setembro, a Suprema Corte dos EUA autorizou o governo Trump a abordar e deter imigrantes com base em sua raça ou idioma, uma medida que a comunidade vê como uma “carta branca”. Essa permissão judicial, somada à Operação Patriot 2.0 em Massachusetts, tem levado a mudanças drásticas de comportamento. Há mensagens de mulheres compartilhando vídeos com dicas de linguagem de sinais para “nada de falar mais”, e outros pedindo que brasileiros fiquem “americanizados”, sugerindo, inclusive, usar óculos escuros e adesivos de apoiadores de Trump no carro. Júnior afirma, com base nas informações recebidas, que o ICE “prende e depois pergunta”, sem se apegar estritamente a mandados.

Mesmo Júnior, que está em processo de obtenção do green card por meio do visto U (concedido a vítimas de crimes nos EUA) que herdou da mãe, relata apreensão, pois agentes não se preocupam se o indivíduo é cidadão ou possui green card, especialmente se “fala inglês mal”. Apesar do temor, ele não expressa desejo de retornar ao Brasil, onde foi assaltado durante um mês de férias no ano anterior.

Redes de Apoio e a Luta por Direitos

Ainda que o monitoramento via grupos possa não ser totalmente eficaz, uma vez que o ICE atua “muito rápido”, prendendo e desaparecendo em minutos, redes de voluntários como a LUCE (formada por diversas organizações comunitárias em Massachusetts) oferecem um suporte vital. A LUCE atende a chamados de imigrantes, enviando voluntários para verificar e filmar possíveis ações do ICE. Lorena Betts, responsável pelo braço em português da LUCE e residente nos EUA há 15 anos, desde que chegou via um programa de au pair, conta que o grupo não interfere no trabalho policial, mas “exercita o direito constitucional de documentar”.

Ela se aproximou do tema da imigração trabalhando como intérprete de português nos tribunais de Massachusetts. Quando encontram ruas vazias, os voluntários podem ir de porta em porta em busca de informações ou imagens de câmeras de segurança. Além disso, a LUCE acompanha imigrantes em reuniões com advogados e até os auxiliam com compras de supermercado quando perdas de renda ou impossibilidade de sair de casa afetam a família. Embora existam outros aplicativos específicos para relatar blitzes, muitos na comunidade brasileira os veem com ceticismo, temendo rastreamento. À medida que setembro de 2025 se encerra, não há indícios de que a Operação Patriot 2.0 esteja próxima do fim em Massachusetts, mas a esperança persiste de que não se estenda para o mês de outubro.

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A situação dos imigrantes brasileiros em Massachusetts reflete a complexidade e os desafios da política migratória dos EUA sob a administração Trump, impulsionando a comunidade a desenvolver estratégias criativas e redes de apoio sólidas. Para continuar acompanhando os desdobramentos sobre política, sociedade e os impactos das decisões governamentais em comunidades ao redor do mundo, explore mais conteúdos em nossa editoria de Política.

Crédito da imagem: Reprodução


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