Uruguai Aprova Lei da Eutanásia: A História de Pablo Salgueiro

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A aprovação da Lei da Eutanásia no Uruguai marca um momento significativo no debate sobre o direito à morte digna. O trâmite legislativo foi impulsionado, em parte, pela tocante história de Pablo Salgueiro, um professor de artes cuja batalha contra a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) o transformou em um emblema da causa. Embora Pablo tenha falecido anos antes da oficialização da lei, sua jornada e a incansável defesa de sua filha, Florencia Salgueiro, ecoaram nos corredores do parlamento uruguaio, culminando em uma legislação que oferece novas perspectivas a pacientes em condições de sofrimento insuportável.

A trajetória de Pablo foi tragicamente predita pelo histórico familiar, já que seu pai, em 1991, e seu irmão, em 2004, também sucumbiram à Esclerose Lateral Amiotrófica. Esta enfermidade neurodegenerativa afeta progressivamente os neurônios motores, responsáveis pelo controle dos movimentos voluntários, culminando na perda gradual de funções cruciais como movimentar membros, tossir, engolir e, eventualmente, respirar. A profunda consciência da evolução da ELA e de suas consequências devastadoras moldou as decisões e o anseio de Pablo por um desfecho digno, distante do prolongamento do sofrimento.

Uruguai Aprova Lei da Eutanásia: A História de Pablo Salgueiro

O primeiro sinal da ELA para Pablo Salgueiro, em fevereiro de 2017, surgiu de forma sutil, com a falta de resposta do dedão do pé. Naquela época, Pablo tinha 54 anos e sua filha, Florencia, 22. Este sintoma, aparentemente inocente, disparou um alarme em razão do histórico genético da família Salgueiro. Diante de uma doença sem cura, Pablo expressou repetidamente o desejo de ter o direito de escolher o momento de sua partida. Entretanto, na época de seu diagnóstico e morte, a legislação uruguaia não previa a possibilidade da eutanásia, uma realidade que a nova lei busca transformar para futuros pacientes.

A Vida de um Professor de Artes e sua Luta Contra a ELA

Antes do diagnóstico que transformaria sua vida, Pablo Salgueiro dedicava-se ao ensino de arte, um campo em que, ao lado da esposa Rosina Rubio, dirigiu um ateliê em Montevidéu por 27 anos. Ele encontrava grande satisfação em testemunhar a alegria dos alunos, crianças e adultos, explorando sua criatividade com diversas mídias artísticas. Florencia descreve um pai que apreciava a simplicidade: “Gostava de ficar tranquilo em casa, passear com o cachorro, descer até a praia, ver o pôr do sol.” A leitura, a história e as conversas sobre política também preenchiam seus dias. Esse retrato de um homem vibrante contrasta drasticamente com a devastação imposta pela doença.

Ciente das dolorosas experiências do pai e do irmão com a ELA, Pablo, ao receber seu próprio diagnóstico, não se entregou inicialmente à enfermidade. Florencia lembra que ele buscava ativamente maneiras de se adaptar e encontrar um caminho para viver com a condição. Uma de suas primeiras ações práticas foi a construção de uma rampa de acesso em sua casa de veraneio em Los Titanes, a 65 km de Montevidéu, antevendo as futuras dificuldades de locomoção. Mesmo sabendo das limitações da medicina para deter a doença, ele tentou diversas terapias alternativas, desde dieta macrobiótica até acupuntura egípcia, numa tentativa desesperada de manter uma esperança e retardar o inevitável.

A Progressão Impiedosa da ELA e a Perda Gradual de Funções

A ELA seguiu seu curso implacável, e Pablo começou a perder progressivamente a capacidade de se mover autonomamente. O pé foi o primeiro a falhar, seguido por dificuldades para permanecer em pé e caminhar. A mobilidade diminuiu da bengala para muletas, depois para um andador, até a completa imobilidade. Florencia descreve “picos” na doença, com períodos de estabilidade intercalados por momentos de rápida deterioração. A fraqueza muscular se espalhou das pernas para as mãos, afetando a coordenação motora fina e a força necessária para tarefas cotidianas, como segurar objetos ou fazer anotações.

À medida que a doença avançava, a ELA afetava também músculos faciais, levando à perda de tônus e flexibilidade, culminando na incapacidade de tossir para expelir o muco dos pulmões. Este foi um ponto de inflexão crítico, que levou a família a adquirir um aparelho BiPAP para auxiliar a respiração de Pablo durante a noite. Após quase três anos do diagnóstico, o sofrimento de Pablo intensificou-se, tornando as crises de sufocamento noturnas mais frequentes e angustiantes.

O Desejo Irreversível por um Fim Digno

Em dezembro de 2019, Pablo reunido com sua esposa e filhas na sala de estar, fez uma declaração comovente: “Não quero mais. Isto já não é vida.” Exausto pelo sofrimento contínuo, as dificuldades respiratórias noturnas e a convicção de que já conhecia o final da doença por sua família, ele expressou claramente o desejo de morrer. Pablo não queria que sua família tivesse qualquer responsabilidade sobre a sua morte, buscando nos médicos a intervenção. Seu pedido de auxílio, no entanto, colidia com a legalidade vigente na época, sendo respondido com a indicação de opções como a interrupção da alimentação e hidratação – alternativas que ele via como inaceitáveis e uma forma indireta de suicídio que sua condição física já debilitada não lhe permitiria praticar de forma ativa, caso ele mesmo quisesse acelerar o processo. Ele faleceu em 19 de março de 2020, após receber sedação paliativa devido a sintomas refratários, caracterizados por sofrimento intolerável.

A Campanha Pela Lei da Eutanásia no Uruguai e o Papel de Florencia Salgueiro

Antes de seu falecimento, uma das últimas comunicações de Pablo Salgueiro à sua filha Florencia incluía um link para uma notícia sobre o projeto de lei de eutanásia, apresentado ao Congresso uruguaio pelo deputado Ope Pasquet. Este foi um marco que plantou a semente do ativismo em Florencia.

Uruguai Aprova Lei da Eutanásia: A História de Pablo Salgueiro - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

Um ano após a morte de seu pai, em março de 2021, Florencia compartilhou a história de Pablo no Twitter, defendendo a morte assistida. Essa atitude a conectou ao grupo Empatía Uruguay, uma organização de famílias afetadas por doenças crônicas, que lutavam pelo direito à eutanásia. Florencia tornou-se porta-voz e, ao lado de sua mãe e irmã, acompanhou de perto a sessão parlamentar de dez horas em 15 de outubro, quando o Senado uruguaio aprovou o projeto de lei “Muerte digna”. Pesquisas da consultoria Cifra indicaram que 62% dos uruguaios eram favoráveis à medida. A nova legislação permite que adultos mentalmente capazes, com uma doença incurável ou irreversível em fase terminal ou em sofrimento intolerável, possam optar pela eutanásia, realizada por um profissional de saúde. Exausta, mas satisfeita, Florencia expressou sua esperança de que nenhuma outra família precise passar pelo que a sua vivenciou, orgulhosa do papel do pai e do seu próprio papel na história. No Brasil, a eutanásia permanece proibida, sendo crime auxiliar na morte de alguém. Contudo, a ortotanásia, que permite a interrupção de tratamentos de pacientes terminais por vontade própria, é uma prática autorizada pelo Conselho Federal de Medicina desde 2006.

Compreendendo a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)

A ELA, ou esclerose lateral amiotrófica, é uma doença neurodegenerativa progressiva e sem cura, listada entre as principais condições como Parkinson e Alzheimer. Caracteriza-se pela deterioração e morte dos neurônios responsáveis por enviar comandos aos músculos, resultando em enfraquecimento muscular, contrações involuntárias e eventual incapacidade de movimentar o corpo.

Os sintomas iniciais da ELA geralmente se manifestam após os 50 anos, embora possam surgir em idades mais jovens. Eles incluem espasmos musculares e fraqueza, frequentemente em um membro, dificuldades na fala e deglutição, engasgos, problemas de dicção, rouquidão, queda da cabeça, e perda de peso. A doença afeta drasticamente a capacidade do indivíduo de se mover, falar e respirar. Para saber mais sobre esta condição, consulte informações detalhadas fornecidas pelo Ministério da Saúde do Brasil, que atesta sua gravidade e complexidade.

A idade é o fator de risco mais significativo, com maior prevalência entre 55 e 75 anos. Embora 85-90% dos casos sejam esporádicos e de causa desconhecida, cerca de 10-15% são de natureza familiar, resultando de mutações genéticas específicas transmitidas hereditariamente. No entanto, mesmo em casos familiares, o gene afetado pode variar. A taxa de sobrevivência média varia de três a cinco anos após o diagnóstico, mas aproximadamente 25% dos pacientes conseguem viver por mais de cinco anos, como foi o caso do renomado físico britânico Stephen Hawking, um dos mais conhecidos portadores da ELA, que faleceu em 2018.

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A aprovação da Lei da Eutanásia no Uruguai é um marco na busca pela dignidade no fim da vida, impulsionada por histórias de sofrimento e coragem como a de Pablo Salgueiro. Este movimento legislativo reflete uma crescente discussão global sobre autonomia do paciente e direitos individuais diante de doenças incuráveis. Acompanhe nossas atualizações e análises sobre temas importantes na esfera social e política em nosso portal.

Crédito: Cortesía de Florencia Salgueiro


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