Barroso pode votar descriminalização do aborto antes do STF

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Há uma crescente expectativa no meio jurídico e na sociedade em torno de um possível último ato do ministro Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF) antes de sua aposentadoria: um voto decisivo na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, que busca a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Essa movimentação ocorre em um cenário semelhante ao de 2023, quando a então presidente da Corte, ministra Rosa Weber, proferiu seu voto favorável à interrupção da gravidez pouco antes de deixar o cargo, um gesto que ressaltou a natureza de escolha da maternidade e classificou a imposição da continuidade gestacional como uma forma de violência institucional.

A discussão em torno do aborto legal representa um dos temas mais delicados e aguardados no Judiciário brasileiro. A ADPF 442, protocolada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) no início de 2017, já foi interrompida uma vez por pedido do próprio ministro Barroso, que solicitou que o julgamento saísse do plenário virtual e fosse debatido em plenário físico. Desde então, a matéria permaneceu sem previsão para retornar à pauta, gerando um impasse na Corte sobre essa questão crucial. O horizonte de sua saída, fixada para esta sexta-feira (17/10), intensifica a pressão para uma manifestação.

Barroso pode votar descriminalização do aborto antes do STF

A comunidade jurídica e defensores dos direitos reprodutivos monitoram atentamente os próximos passos do ministro Barroso, especialmente à luz de sua aposentadoria antecipada, originalmente prevista para 2033, mas anunciada recentemente por “razões pessoais”. Conforme expressou, Barroso almeja uma vida com menor exposição pública, mais espaço para espiritualidade, literatura e poesia. No entanto, sua trajetória na defesa de pautas progressistas no Supremo o coloca no centro das atenções, com a possibilidade de seu voto deixar uma marca indelével no debate. O portal oficial do Supremo Tribunal Federal (STF) oferece informações adicionais sobre os processos e a atuação da Corte, sendo uma fonte primária para entender o funcionamento dessas ações complexas.

Nesta semana, a expectativa por um posicionamento do ministro foi intensificada. Uma carta, enviada na quarta-feira (15/10) por 61 entidades e mais de 200 indivíduos ao gabinete de Barroso, apela para que ele registre seu voto não apenas na ADPF 442, mas também em outras duas ações relativas ao aborto. A ADPF 1207, em específico, busca autorizar outros profissionais de saúde, como enfermeiros, a realizar o aborto legal, ampliando o acesso e a capilaridade desse tipo de atendimento. Já a ADPF 989 pleiteia que o Supremo Tribunal Federal estabeleça mecanismos claros para garantir o direito à interrupção da gestação nos casos já permitidos pela legislação penal brasileira — ou seja, gravidez resultante de estupro, risco de vida para a gestante e fetos anencéfalos.

Historicamente, Barroso já manifestou sua visão favorável à descriminalização do aborto em diversas ocasiões. Antes de sua nomeação como ministro em 2012, ele atuou como advogado em uma ação que culminou na liberação do aborto para casos de anencefalia. Já como membro da Corte, em março de 2017, durante um seminário promovido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), Barroso argumentou que a criminalização do aborto representa uma violação da autonomia e da igualdade feminina, indicando que a questão seria há muito tempo resolvida caso a gestação pudesse ser experienciada por homens. No ano seguinte, em um congresso de Direito e Gênero da FGV, no Rio de Janeiro, ele reforçou que o Judiciário deveria liderar a discussão, pois “a mulher não é um útero a serviço da sociedade”, e que “a criminalização se tornou uma má política”.

Apesar do clamor, o caminho processual para a descriminalização não é automático mesmo com o voto favorável do ministro. Juristas como Pierpaolo Bottini, professor de Direito Penal da USP, esclarecem que o voto de um ministro antes de se aposentar não altera a dinâmica processual; a inclusão do tema em pauta é prerrogativa exclusiva do presidente do STF. Dessa forma, caberia ao ministro Edson Fachin, atual presidente da Corte, dar continuidade ao processo, algo que o próprio Barroso, quando presidiu o STF entre 2023 e 2025, não priorizou.

Contrário aos movimentos pró-descriminalização, existe um segmento significativo que se opõe veementemente à flexibilização das leis. Esses grupos argumentam, com base em preceitos religiosos e éticos, que o direito à vida começa no momento da concepção, devendo sobrepor-se ao direito à autonomia corporal da mulher. Apesar das tentativas da imprensa em contatar entidades como a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), a União dos Juristas Católicos (Ujuca) e o Instituto de Defesa da Vida e da Família (IDVF), não houve retorno por parte dessas instituições até o fechamento da reportagem. Além disso, a pauta foi questionada por figuras políticas, como o senador Eduardo Girão (Novo-CE), que em 2023 manifestou ser contrário à priorização do tema na agenda nacional, levantando a indagação se a descriminalização seria de fato um desejo da população ou de “poucos militantes que usam toga”.

Barroso pode votar descriminalização do aborto antes do STF - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

Uma pesquisa Ipsos-Ipec, realizada em julho deste ano, reflete a complexidade do tema: 75% dos brasileiros rejeitam a descriminalização do aborto, um aumento de dois pontos percentuais em relação ao levantamento anterior, de 2023. Apenas 16% dos entrevistados se declaram a favor, uma queda de dois pontos percentuais em comparação com dois anos antes. Dentro do próprio STF, ministros como Kássio Nunes Marques e André Mendonça já se posicionaram publicamente contra qualquer ampliação do acesso ao aborto. Em sua sabatina no Senado em 2020, Nunes Marques destacou que suas convicções pessoais e familiares o colocam em defesa incondicional do direito à vida, considerando que as três hipóteses já permitidas pela legislação brasileira são adequadas.

Com a saída de Barroso, a nomeação de seu sucessor pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) torna-se um ponto de inflexão crucial. O novo ministro herdará todas as ações sob relatoria de Barroso, incluindo aquelas relacionadas ao aborto legal, como a possibilidade de outros profissionais de saúde realizarem o procedimento e a garantia de interrupção da gestação em casos já previstos. Embora não haja um prazo rígido para a indicação – Dilma Rousseff levou quase um ano para indicar Edson Fachin em 2015 –, nomes já circulam como potenciais escolhidos. Jorge Rodrigo Araújo Messias, atual advogado-Geral da União (AGU), é frequentemente apontado como o favorito por juristas próximos, dada sua trajetória em governos petistas e proximidade com Lula. Outros nomes cotados incluem o desembargador federal Rogério Favreto (TRF da 4ª região), o ministro do TCU Bruno Dantas, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Wellington César Lima e Silva, ex-secretário de Assuntos Jurídicos da Presidência e advogado da Petrobras. O nome indicado pelo presidente deverá passar pela aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e, posteriormente, pelo plenário da Casa, necessitando da maioria absoluta dos votos.

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A potencial votação do ministro Barroso representa um momento crucial para o futuro das discussões sobre os direitos reprodutivos no Brasil. Seja qual for o desfecho, o debate sublinha a complexidade da intersecção entre legislação, saúde pública e questões éticas, que continua a mobilizar diferentes setores da sociedade. Para se manter informado sobre este e outros temas relevantes para a política e justiça brasileira, continue acompanhando nossa editoria de Política.

Crédito da imagem: Antonio Cruz/Agência Brasil


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