📚 Continue Lendo
Mais artigos do nosso blog
O Ministério das Relações Exteriores do Brasil (MRE) emitiu uma forte nota nesta terça-feira, 26 de agosto, qualificando as declarações de um ministro do governo israelense de “ofensas, inverdades e grosserias inaceitáveis”. A manifestação do Itamaraty ocorreu após o ministro da Defesa de Israel, Israel Katz, classificar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como “antissemita” e “apoiador do Hamas”, intensificando a recente troca de acusações entre as duas nações.
A reação do governo brasileiro foi publicada por meio do perfil oficial do MRE na plataforma X (antigo Twitter), no período da tarde. O comunicado oficial descreveu que o “Ministro da Defesa e ex-chanceler israelense, Israel Katz, voltou a proferir ofensas, inverdades e grosserias inaceitáveis contra o Brasil e o Presidente Lula”, conforme trecho da postagem diplomática.
A crítica de Katz ao líder brasileiro, veiculada nas suas próprias redes sociais, também incluía a afirmação de que Lula “revelou sua verdadeira face como antissemita declarado e apoiador do Hamas”. A declaração foi acompanhada por uma imagem adulterada de Lula, na qual ele aparecia como uma marionete do líder supremo do Irã, Ali Khamenei, figura vista como um dos maiores opositores políticos de Israel. O ataque digital ocorreu no contexto da retirada do Brasil da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA), um movimento que reflete o crescente afastamento entre os dois países.
Na sua resposta oficial, o Itamaraty reforçou sua posição anterior ao acusar novamente Israel de prática de genocídio contra a população palestina na Faixa de Gaza. “Como Ministro da Defesa, o senhor Katz não pode se eximir de sua responsabilidade, cabendo-lhe assegurar que seu país não apenas previna, mas também impeça a prática de genocídio contra os palestinos”, reiterou o ministério brasileiro em sua publicação.
Suposto “rebaixamento” das relações bilaterais
A nova tensão diplomática segue-se a notícias sobre um possível “rebaixamento” das relações bilaterais por parte de Israel, veiculadas pelo jornal israelense Haaretz. Considerado um dos periódicos mais respeitados e antigos de Israel, com uma linha editorial crítica à campanha militar em Gaza, o Haaretz reportou que a decisão israelense estaria relacionada à falta de resposta do governo brasileiro sobre a nomeação de Gali Dagan como novo embaixador de Israel no Brasil. O posto diplomático encontra-se sem titular israelense há aproximadamente duas semanas, devido à ausência do agrément, o consentimento formal de um país à designação de um diplomata estrangeiro.
Conforme informações reportadas pelo Haaretz, o Ministério das Relações Exteriores de Israel declarou que, após o Brasil, “excepcionalmente, recusar-se a atender a um pedido de reunião do Embaixador Dagan”, Israel optou por “retirar o pedido e as relações entre os países passaram a ser conduzidas em um nível diplomático inferior”. O comunicado israelense adicionava que o ministério “continua mantendo contato próximo com os diversos círculos de amigos que Israel mantém no Brasil”.
No entanto, um diplomata brasileiro, que se manifestou sob condição de anonimato à BBC News Brasil, informou que o governo do Brasil não recebeu nenhuma notificação formal sobre qualquer “rebaixamento” diplomático por parte de Israel. A fonte ressaltou ainda que a terminologia ou a prática de “rebaixamento” no nível de relações entre nações não possui reconhecimento formal na diplomacia internacional. O mesmo diplomata adicionou que, na prática, as embaixadas de ambos os países – a embaixada brasileira em Tel Aviv e a embaixada de Israel em Brasília – continuam suas atividades normais, embora estejam operando sem a presença de seus respectivos embaixadores designados. A reportagem original informou que havia procurado o governo israelense para posicionamento oficial e aguardava uma resposta.
Deterioração de um relacionamento histórico
A intensa troca de críticas e acusações que marcou as últimas 24 horas representa mais um capítulo na deterioração das relações entre Brasil e Israel. Esta crise diplomática se aprofunda continuamente desde o início da gestão do presidente Lula, sendo composta por uma série de incidentes e posições contrastantes.
Mais recentemente, o governo brasileiro decidiu aderir à ação movida pela África do Sul contra Israel perante a Corte Internacional de Justiça (CIJ), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU). Essa adesão sublinha o posicionamento crítico do Brasil em relação às ações militares israelenses na Faixa de Gaza.
Desde o ano anterior, o presidente Lula foi declarado “persona non grata” pelo governo israelense, uma das medidas diplomáticas mais severas para expressar descontentamento de um país para com outro. Quem anunciou esta condição foi justamente Israel Katz, que, na ocasião, era o chanceler de Israel e, atualmente, é seu ministro da Defesa. A declaração foi feita durante uma reunião com Frederico Meyer, então embaixador do Brasil em Israel, no Museu do Holocausto em Jerusalém.
A medida extrema foi uma resposta direta à comparação feita pelo presidente Lula entre a ofensiva militar de Israel em Gaza e o Holocausto, que foi o genocídio de milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial promovido pelos nazistas. Em resposta à fala de Lula, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirmou que a comparação ultrapassou uma “linha vermelha inaceitável”.
O governo brasileiro, por sua vez, considerou a situação imposta a Frederico Meyer – ser convocado a um local simbólico para ser publicamente repreendido – como um grave insulto à sua nação. Diante dos crescentes atritos e da falta de resolução diplomática para a situação, Lula optou, em maio de 2024, por retirar Meyer de Israel. Desde então, a embaixada brasileira em Tel Aviv permanece sem um embaixador.
Complementando a cronologia de atritos, o governo brasileiro não deu seguimento à indicação de Gali Dagan, o diplomata israelense, para ser o novo embaixador de Israel no Brasil. O assunto foi comentado por Celso Amorim, assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República e ex-ministro das Relações Exteriores, em entrevista à TV Globo. Amorim esclareceu que o Brasil não impôs um veto formal ao nome de Dagan, mas simplesmente não concedeu o agrément.
“Pediram um agrément e não demos. Não respondemos. Simplesmente não demos. Eles entenderam e desistiram”, afirmou Amorim. Ele também fez um questionamento retórico em relação ao incidente envolvendo o embaixador Meyer: “Eles humilharam nosso embaixador lá, uma humilhação pública. Depois daquilo, o que eles queriam?”

Imagem: bbc.com
Posicionamento do Brasil sobre a Faixa de Gaza
Celso Amorim fez questão de reiterar que a postura do Brasil não é contra o Estado de Israel, mas sim contra as políticas do atual governo israelense. “Queremos ter uma boa relação com Israel. Mas não podemos aceitar um genocídio, que é o que está acontecendo. É uma barbaridade. Nós não somos contra Israel. Somos contra o que o governo Netanyahu está fazendo”, declarou o assessor.
Benjamin Netanyahu, por sua vez, consistentemente rechaça as acusações de genocídio em Gaza, classificando-as como “uma campanha de mentiras”.
A guerra na Faixa de Gaza teve início após um ataque coordenado pelo grupo palestino Hamas contra Israel em 7 de outubro do ano anterior. O ataque resultou na morte de aproximadamente 1.200 pessoas e no sequestro de outras 251, levadas como reféns para Gaza.
Em resposta, Israel iniciou uma vasta e contínua ofensiva militar no território palestino. Essa campanha, que ainda está em andamento, já provocou a morte de mais de 62.744 pessoas, segundo dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, administrado pelo Hamas, e que são considerados críveis pela Organização das Nações Unidas.
O governo de Netanyahu tem sido alvo de crescentes críticas internacionais devido à grave crise humanitária que se instaurou em Gaza em decorrência de sua ofensiva. Organizações como a ONU relatam que os moradores da região enfrentam fome e condições de vida extremamente precárias.
Este cenário de deterioração humanitária e críticas tem levado uma série de nações a anunciar ou sinalizar seu reconhecimento do Estado Palestino. Entre esses países, destacam-se a França, Canadá, Reino Unido, Portugal, Espanha e Noruega. Atualmente, 147 dos 193 Estados-membros da ONU já realizaram este reconhecimento formal, sendo o Brasil um deles desde o ano de 2010. Israel, por sua vez, posiciona-se firmemente contra a proposta de reconhecimento unilateral do Estado Palestino.
O “fator Trump” nas relações Brasil-Estados Unidos
Além das tensões com Israel, o Brasil também enfrenta uma grave crise diplomática com os Estados Unidos, que é o principal aliado de Israel na sua ofensiva militar na Faixa de Gaza. As relações entre Brasília e Washington começaram a se deteriorar significativamente a partir de julho do ano anterior.
Naquele período, o ex-presidente norte-americano Donald Trump, que concorre à eleição de novembro, anunciou a imposição de tarifas de 50% sobre produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos. Esta ação tarifária foi seguida pela aplicação de sanções a autoridades brasileiras, incluindo o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, sob a égide da Lei Global Magnitsky, que permite a imposição de sanções por violações de direitos humanos ou atos de corrupção.
No início do corrente ano, Trump ventilou um plano segundo o qual os Estados Unidos poderiam assumir o controle da Faixa de Gaza e realocar a população palestina para outro território. Essa proposta dependeria da cooperação de Estados árabes, que prontamente a rejeitaram. Além disso, os Estados Unidos ofereceram apoio a Israel em ataques contra o Irã, ocorridos em junho, intensificando a presença americana na dinâmica regional.
Donald Trump mantém uma relação considerada próxima com Benjamin Netanyahu, tanto que, em julho do ano anterior, o primeiro-ministro israelense chegou a manifestar publicamente a intenção de indicar Trump para o Prêmio Nobel da Paz, sublinhando a conexão pessoal e política entre os dois líderes.
Com informações de BBC News Brasil
Recomendo
🔗 Links Úteis
Recursos externos recomendados