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Diante do iminente julgamento de Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal (STF), a possibilidade de um indulto ou anistia tem se configurado como um elemento crucial no cenário político para as eleições presidenciais de 2026. Pré-candidatos de direita ao cargo máximo do Executivo têm feito declarações públicas que vinculam o eventual perdão ao ex-presidente ao capital político da base bolsonarista, sinalizando um compromisso que pode influenciar decisivamente o apoio nas urnas.
O julgamento de Bolsonaro está agendado para iniciar em 2 de setembro de 2025 no STF. Ele enfrenta acusações relacionadas à suposta tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, entre outras imputações. Uma condenação resultaria em um desfecho significativo para a trajetória política do ex-mandatário, intensificando as discussões e as promessas em torno de possíveis mecanismos de clemência, como o indulto e a anistia, que, em caso de eventual eleição de um aliado, poderiam ser concedidos.
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Candidatos Manifestam Intenção de Conceder Indulto ou Anistia
Nos últimos meses, importantes figuras da política brasileira têm se posicionado sobre a concessão de perdão a Jair Bolsonaro, caso ele seja condenado e um de seus apoiadores ocupe a Presidência em 2026. Essas promessas não apenas buscam mobilizar a base de eleitores bolsonaristas, mas também se tornam um ponto central nas articulações para a sucessão presidencial.
Um dos mais notórios pré-candidatos a defender abertamente essa medida é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). No sábado, 30 de agosto de 2025, Tarcísio declarou ao Diário do Grande ABC que a concessão de um indulto a Bolsonaro seria a primeira providência que ele tomaria caso fosse eleito presidente da República. Ele expressou a natureza imediata de sua intenção, afirmando: “Na hora. Primeiro ato. Porque eu acho que tudo isso que está acontecendo é absolutamente desarrazoado”. A fala representa a primeira vez que Tarcísio se manifesta de forma tão explícita sobre a aplicação do indulto, embora sua sinalização em defesa do ex-presidente não seja inédita. Anteriormente, ele já havia compartilhado palanque com Bolsonaro em manifestações públicas que clamavam pela anistia, o que era visto como uma defesa velada de medidas de perdão para casos relacionados.
Outro nome de destaque é o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que já havia demonstrado inclinação semelhante em fevereiro de 2025. Em entrevista à GloboNews, Caiado indicou sua intenção de “anistiar [Bolsonaro] e começar uma nova história no Brasil”, um claro sinal de sua postura em relação ao ex-presidente. Essa posição foi reiterada em março de 2025, durante um evento na Avenida Paulista, em São Paulo, onde o governador de Goiás declarou publicamente: “A gente está aqui para pedir, lutar e mostrar que todos estamos juntos para exigir anistia daqueles inocentes que receberam penas desarrazoadas”. Em um tom desafiador, Caiado ainda questionou: “Quero ver quem vai ter coragem de se opor [ao projeto da anistia]”. Suas declarações solidificam uma proposta política que visa apaziguar tensões e promover o que ele chamou de “nova história”.
Da mesma forma, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), manifestou-se favorável à anistia ao ex-presidente. Em agosto de 2025, Zema afirmou à BBC News Brasil que a anistia seria uma forma de “passar uma régua nisso, uma borracha, e olhar para o futuro”. Para ele, a medida seria um marco para o país seguir em frente, reforçando a ideia de que o perdão político se alinharia a uma visão de encerramento de disputas passadas.
A importância dessas promessas é sublinhada pela própria família do ex-presidente. O senador e filho de Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), concedeu uma entrevista à Folha de S.Paulo em junho de 2025, na qual ressaltou o caráter essencial de tais compromissos. Ele indicou que Jair Bolsonaro “não só vai querer apoiar alguém que banque a anistia ou o indulto, mas que seja cumprido”, destacando que a concretização da promessa seria determinante para o endosso político. Essa afirmação sugere que as declarações dos pré-candidatos não são meras retóricas eleitorais, mas sim pontos fundamentais que exigem garantia de execução.
Indulto e Anistia: Compreendendo os Instrumentos Jurídicos
Os termos “indulto” e “anistia” são mecanismos previstos no Código Penal brasileiro, ambos com a capacidade de conceder clemência em casos de condenação judicial. Embora frequentemente mencionados no mesmo contexto, possuem características e processos de concessão distintos. Em sua essência, tanto o indulto quanto a anistia podem potencialmente livrar um indivíduo, como o ex-presidente, de uma pena eventual. No entanto, enquanto tramitam inicialmente na esfera política – seja Executiva ou Legislativa – ambos podem, e frequentemente acabam, sendo submetidos à avaliação do Supremo Tribunal Federal (STF), que pode ter a palavra final sobre sua constitucionalidade e aplicação.
Como Funciona o Indulto
O indulto é um benefício de clemência que é concedido diretamente pelo presidente da República em exercício. Sua formalização ocorre por meio de um Decreto presidencial. Tradicionalmente, são mais conhecidos os indultos coletivos, como os “indultos de Natal”, que são publicados anualmente no fim de cada ano, beneficiando uma série de detentos que preenchem requisitos pré-determinados, como tempo de pena cumprido e natureza do crime.
Contudo, o presidente também detém a prerrogativa de conceder um indulto de maneira individualizada, especificamente a uma única pessoa. Quando isso acontece, o termo técnico empregado é “graça”. A concessão da graça depende da formulação de um pedido formal, que pode ser originado pelo próprio indivíduo preso, por qualquer cidadão que o solicite em seu favor, ou mesmo pelo Ministério Público. Diferentemente da anistia, em ambos os tipos de indulto (coletivo ou individual), a pena privativa de liberdade é explicitamente excluída. No entanto, é fundamental destacar que os seus efeitos secundários da condenação permanecem válidos. Isso significa que o indivíduo que recebe o indulto não recupera a primariedade como réu, e, no caso de políticos eleitos, mantém-se a perda do mandato, conforme as implicações da condenação original.
O Precedente do Caso Daniel Silveira
A discussão em torno de um eventual indulto a Jair Bolsonaro é diretamente influenciada por um precedente notório no histórico político-judicial recente: o caso do ex-deputado federal Daniel Silveira. Em 2022, quando ainda ocupava a cadeira da Presidência da República, Jair Bolsonaro assinou um decreto concedendo o indulto individual ao então deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), um aliado político próximo.
Silveira havia sido previamente condenado pelo Supremo Tribunal Federal a uma pena de oito anos e nove meses de prisão, além de multa, perda do mandato parlamentar e suspensão dos seus direitos políticos. As acusações que levaram à sua condenação referiam-se aos crimes de coação em processo judicial e tentativa de impedir o livre exercício dos poderes da União. Os delitos ocorreram entre os anos de 2020 e 2021, período em que Daniel Silveira divulgou em suas redes sociais uma série de vídeos que atacavam a Suprema Corte e o próprio Estado Democrático de Direito, defendendo, inclusive, uma intervenção militar e proferindo ofensas pessoais a diversos membros do tribunal.
Em um desdobramento que marcou um ponto crucial para a interpretação dos poderes presidenciais em matéria de indulto, o Supremo Tribunal Federal, em maio de 2023, anulou por unanimidade o indulto concedido a Daniel Silveira. A Corte entendeu que houve um flagrante “desvio de finalidade” na concessão do benefício. O principal argumento para essa decisão foi que o indulto teria sido outorgado única e exclusivamente em razão da proximidade e da aliança política entre o presidente Jair Bolsonaro e o então deputado Silveira. Além disso, os ministros do STF consideraram que as ameaças proferidas pelo ex-parlamentar configuravam crimes políticos contra o Estado Democrático de Direito, o que, por sua própria natureza, os tornaria insuscetíveis de perdão via indulto presidencial. O benefício, na visão do tribunal, não poderia ser utilizado para crimes dessa gravidade contra as instituições.

Imagem: bbc.com
A ministra Rosa Weber, então relatora do caso no Supremo, foi enfática em seu voto, proferindo uma declaração que ecoou a visão da Corte sobre a matéria. Ela afirmou que a competência do presidente da República para editar indultos não pode, de forma alguma, ser utilizada para criar um “círculo de virtual imunidade penal” em torno de seus aliados. A ministra enfatizou que a instrumentalização do Estado, de suas instituições e de seus agentes públicos para a obtenção de benefícios de natureza meramente subjetiva e pessoal, por meios ilícitos, ilegítimos e imorais, é inaceitável. Segundo suas palavras, tal conduta subverteria os “postulados mais básicos do Estado democrático de direito”, representando uma grave violação dos princípios que regem a República.
Análise de Especialistas Sobre Possível Indulto para Bolsonaro
A controvérsia jurídica em torno do indulto se intensifica quando aplicada ao cenário atual envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro. Especialistas em direito criminal alertam para as complexidades e os desafios de um eventual indulto, em grande parte com base no precedente estabelecido pelo caso Daniel Silveira.
Para Pierpaolo Bottini, advogado criminalista e renomado professor de Direito Penal, a postura do Supremo Tribunal Federal, estabelecida na decisão sobre o indulto de Daniel Silveira, deve servir como um guia. Ele observa que, no caso Silveira, o STF reconheceu a inconstitucionalidade do benefício para indivíduos que cometeram ataques ou agressões direcionadas a membros de outro Poder da República. Bottini avalia que, caso a Corte decida manter essa linha interpretativa – o que ele considera provável –, um indulto concedido a Bolsonaro, dadas as acusações de crimes contra o Estado Democrático de Direito, seria igualmente “inconstitucional”. Isso aponta para uma jurisprudência que desfavorece o uso do indulto em casos que ameacem as instituições.
Corroborando essa perspectiva, Maíra Fernandes, advogada criminalista e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ), destaca outra limitação. Ela recorda que o mais recente decreto de indulto presidencial, emitido em 2024, já incorporou uma previsão expressa que impede a concessão do benefício em situações de crimes contra o Estado Democrático de Direito. Essa cláusula, incluída nos requisitos do indulto coletivo anual, reflete a crescente preocupação do sistema jurídico em proteger as instituições. Maíra Fernandes afirma que, embora Bolsonaro até pudesse fazer um pedido de indulto individual (graça), a resposta que ele “provavelmente receberia é que historicamente o indulto não é concedido para esses crimes”, ou seja, para aqueles que afetam a estabilidade democrática.
A Via da Anistia e o Papel do Congresso Nacional
Além do indulto, a anistia emerge como outra ferramenta jurídica no debate sobre o futuro legal de Jair Bolsonaro e seus apoiadores. Contudo, seu processamento é substancialmente distinto, concentrando-se na esfera legislativa e, por natureza, com efeitos mais amplos. Atualmente, a discussão sobre a anistia ganha corpo no Congresso Nacional, onde tramita um projeto de lei específico.
Este projeto tem como objetivo principal conceder perdão àqueles que participaram dos atos de 8 de janeiro de 2023, assim como de manifestações que ocorreram antes ou depois daquela data, contanto que estivessem diretamente relacionadas ao evento. A grande diferença da anistia em relação ao indulto reside em seu efeito legal: enquanto o indulto extingue a pena e mantém as consequências secundárias da condenação (como a perda da primariedade ou do mandato), a anistia tem um alcance muito maior, apagando não apenas a pena imposta, mas todas as suas consequências jurídicas, como se o crime nunca tivesse ocorrido. Isso resultaria na recuperação de direitos políticos e de quaisquer outros impactos diretos da condenação.
Politicamente, há uma forte pressão da oposição para que o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), inclua o projeto de anistia na pauta de votação. Contudo, até o momento, a matéria ainda não foi apreciada em plenário. Constitucionalmente, a competência para conceder a anistia recai sobre o Congresso Nacional, exigindo a aprovação de uma lei. Entretanto, da mesma forma que ocorre com o indulto, o benefício da anistia não está imune a um eventual escrutínio judicial. Ele pode ser questionado e, se houver uma ação formal, levado ao Supremo Tribunal Federal, que avaliaria a sua validade constitucional. Essa possibilidade de revisão pelo Judiciário é uma salvaguarda contra o uso político-partidário irrestrito de mecanismos de clemência.
Em 18 de agosto de 2025, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luis Roberto Barroso, fez uma distinção fundamental sobre a aplicação da anistia. Durante uma palestra para a Associação de Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso, Barroso esclareceu que, do “ponto de vista jurídico, anistia antes de julgamento é uma impossibilidade, não existe”, enfaticamente argumentando que “não se anistia sem julgar”. Ele ressaltou que, até que haja um julgamento e uma eventual condenação, não há base jurídica para a concessão de anistia. No entanto, o ministro pontuou que a situação se transforma “depois do julgamento”, momento em que a anistia “passa a ser uma questão política”. Em tal cenário, segundo Barroso, as “questões políticas vão ser definidas pelo Congresso”, sinalizando que o Poder Legislativo teria a prerrogativa de agir, mas somente após a finalização da instância judicial. Ele se absteve de emitir qualquer opinião pessoal sobre o mérito, enfatizando que não estava dizendo se a anistia seria “boa ou ruim”, nem se deveria “fazer ou não fazer”, limitando-se a apresentar a delimitação jurídica e política.
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Assim, independentemente do caminho que se materialize — seja pelo indulto presidencial, concedido via Poder Executivo, ou pela anistia legislativa, aprovada pelo Congresso Nacional —, ambos os benefícios compartilham um ponto em comum: sua concessão inicial ocorre, e somente depois, o Supremo Tribunal Federal entra em cena para julgar a constitucionalidade do ato, caso seja provocado a fazê-lo. Este processo, como ilustrado pelo caso de Daniel Silveira, cuja decisão da Corte que anulou o indulto se deu mais de um ano após sua concessão e condenação inicial, pode envolver um período considerável de tempo, prolongando a incerteza jurídica em torno do destino do ex-presidente e seus apoiadores.
Com informações de BBC News Brasil
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