📚 Continue Lendo
Mais artigos do nosso blog
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve no Vaticano nesta segunda-feira, 13 de outubro, para um encontro significativo com o Papa Leão 14. A reunião, descrita por fontes da diplomacia brasileira como “leve e produtiva”, marcou um gesto de aproximação entre os líderes, com o presidente brasileiro afirmando que ambos “já eram amigos”, conforme relatos obtidos em caráter reservado.
Acompanhando o chefe de Estado, estiveram presentes a primeira-dama Janja, os ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores), Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar). Também participaram o embaixador do Brasil junto ao Vaticano, Everton Vieira, e outros membros da delegação brasileira.
Lula e Papa Leão 14 se Encontram no Vaticano em Diálogo
Inicialmente, a audiência previa um formato restrito, envolvendo apenas o pontífice, o presidente Lula e a primeira-dama em uma conversa privada. Posteriormente, os ministros e demais membros da comitiva se uniram à reunião, ampliando o diálogo sobre diversos temas de interesse global e bilateral.
Contrariando as expectativas iniciais de uma “visita de Estado”, a Santa Sé comunicou ao governo brasileiro, poucas horas antes do compromisso, que o evento seria tratado como uma reunião privada. Esta mudança implicou na ausência de algumas formalidades tradicionalmente concedidas a chefes de Estado, como a participação de autoridades diplomáticas da Santa Sé, a exemplo do cardeal secretário de Estado, Pietro Parolin. A natureza privada do encontro geralmente indica que questões de caráter público e estatal são abordadas de forma menos formal ou abrangente, embora o presidente Lula tenha destacado ter dialogado com o pontífice sobre “religião, fé, o Brasil e os imensos desafios que temos que enfrentar no mundo”. Segundo membros do Ministério de Relações Exteriores brasileiro, a decisão foi do Vaticano, comunicada sem detalhes adicionais.
No ritual de costume, Lula e Leão 14 realizaram a tradicional troca de presentes. O líder católico agraciou o presidente brasileiro com uma placa em baixo-relevo de prata, confeccionada artesanalmente e esmaltada a fogo, representando a imagem da Mãe do Bom Conselho. Em contrapartida, Lula ofereceu ao pontífice um quadro do artista indígena Waxamani Mehinako, adornado com grafismos característicos de sua etnia.
Debates Centrais: Justiça Social e Erradicação da Pobreza
Antes mesmo da audiência, fontes da diplomacia brasileira haviam sinalizado que tópicos como justiça social, meio ambiente, defesa da paz e da democracia, e inteligência artificial (IA) seriam pautas prioritárias no encontro entre Lula e o Papa Leão 14. O presidente brasileiro confirmou essas expectativas em postagens em suas redes sociais após a reunião.
A preocupação com a justiça social e o combate à pobreza foi reforçada pela recente publicação da primeira Exortação Apostólica do Papa Leão 14, intitulada “Dilexi Te” (Eu Te Amei, em português). O documento, um ensinamento oficial da Igreja, denuncia as desigualdades econômicas globais e a fome, apelando por uma nova mentalidade em relação às pessoas marginalizadas e criticando a “cultura do descarte”. Nele, o pontífice enfatiza a necessidade de “não baixar a guarda diante da pobreza” e expressa particular preocupação com as condições de milhares de pessoas que diariamente perecem devido à escassez de alimentos e água potável.
Após o diálogo, o presidente Lula expressou seus parabéns ao Papa Leão 14 pela Exortação Apostólica, ressaltando a urgência de “criar um amplo movimento de indignação contra a desigualdade” e classificando o documento como uma referência que deve ser “lida e praticada por todos”. Lula também mencionou ao pontífice sua participação no Fórum Mundial da Alimentação, evento da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) em Roma, destacando os esforços do Brasil em retirar milhões de pessoas do Mapa da Fome pela segunda vez e a iniciativa da “Aliança Global contra a Fome e a Pobreza” que o país lidera mundialmente.
Para o teólogo e historiador Gerson Leite de Moraes, professor na Universidade Presbiteriana Mackenzie, a trajetória de Leão 14 – que viveu por mais de duas décadas no Peru antes de seu papado – confere-lhe profundo conhecimento sobre a realidade social e econômica da América Latina. Essa vivência, segundo Moraes, cria uma “familiaridade ideológica” com o presidente Lula, cujo Partido dos Trabalhadores (PT) foi influenciado pelos movimentos sociais da Igreja Católica brasileira e pela teologia da libertação, também proeminente na região e no Peru nos anos 70 e 80. Isso estabelece conexões históricas, sociais e ideológicas entre os dois líderes.

Imagem: bbc.com
Defesa da Paz, Democracia e Regulamentação da IA
A defesa da paz tem sido um tema central desde o início do pontificado de Leão 14, expresso em seu discurso inaugural na Praça de São Pedro e em múltiplas manifestações sobre conflitos mundiais, incluindo as guerras na Ucrânia e na Faixa de Gaza. A sintonia do Brasil com a Santa Sé nesta pauta era um ponto esperado do encontro, mesmo sem a participação direta do país na resolução desses conflitos.
Filipe Domingues, vaticanista, diretor do Lay Centre e professor na Pontifícia Universidade Gregoriana, ambas em Roma, aponta a similaridade das posições brasileiras e vaticanas, especialmente no conflito em Gaza, citando a defesa “forte do multilateralismo” por parte de Lula na Assembleia Geral da ONU em setembro, alinhada à clara postura da Santa Sé. A valorização da democracia é outro pilar compartilhado; Gerson Leite de Moraes observa o reconhecimento do Vaticano sobre uma crise democrática global, enquanto o Brasil se posiciona como uma democracia robusta, engajada na punição de atos que atentem contra ela.
A regulamentação de novas tecnologias, como as redes sociais e a inteligência artificial (IA), também figurou entre os pontos de interesse. O Papa Leão 14, em mensagem divulgada em junho, já havia ressaltado a urgência de uma “governança global” para essas tecnologias, enfatizando que não devem substituir “o discernimento moral” e a riqueza das interações humanas. A humanidade, conforme o pontífice, está em uma encruzilhada diante do vasto potencial da revolução digital, cujos impactos reverberam em setores como educação, trabalho, saúde e governança. O teólogo e padre Dayvid da Silva, professor da PUC-SP, sugere ainda que o Vaticano poderia buscar revisitar temas como a liberdade religiosa, já abordados no Acordo Brasil-Santa Sé de 2010, assinado durante o segundo mandato de Lula.
Compromisso Ambiental e COP 30 na Amazônia
A agenda ambiental foi um ponto de convergência crucial, com a ministra Marina Silva já tendo formalizado o convite para o Papa Leão 14 participar da COP30 em Belém, entre 10 e 21 de novembro. Gerson Leite de Moraes ressalta que “a questão climática interessa tanto a Lula quanto ao papa”, e o debate da conferência no Brasil é de grande importância para a Igreja Católica. Embora Lula tenha reforçado o convite, o pontífice confirmou sua impossibilidade de comparecer devido a compromissos com o Jubileu, mas assegurou a representação do Vaticano no evento. Lula expressou sua felicidade em saber que o Papa Leão 14 “pretende visitar o Brasil no momento oportuno”, prometendo uma calorosa acolhida pelo povo brasileiro.
Contexto das Relações Católicas no Brasil
O cenário demográfico católico no Brasil, que viu a proporção de fiéis cair de 74% em 2000 para 65% em 2010, conforme o Censo do IBGE, é uma pauta que preocupa estudiosos e membros da Igreja. No entanto, diplomatas ouvidos antes da reunião indicaram que este não seria um tema direto entre Lula e o Papa, mas sim da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Apesar da queda, Gerson Leite de Moraes sugere que o legado do Papa Francisco – e o “reavivamento” trazido por seu pontificado – tem sido visto como um fator de estancamento na perda de fiéis e influência da Igreja Católica, pelos seus posicionamentos.
A ida do presidente Lula a Roma para este encontro não foi isolada. Ele estava na cidade para participar do Fórum Mundial da Alimentação, organizado pela FAO, onde discursaria. O encontro com o pontífice havia sido planejado há alguns dias pelo governo brasileiro, buscando aproveitar a passagem pela capital italiana para estreitar laços com o Vaticano. A agenda apertada de Leão 14, em função da presença de diversos chefes de Estado e representantes governamentais na cidade devido ao fórum, exigiu que o pontífice abrisse uma exceção para a delegação brasileira, pois não costuma receber visitantes tão cedo na manhã. Este é o quarto pontífice a receber Lula no Vaticano durante seus mandatos, sendo os anteriores João Paulo II, Bento XVI e Francisco. A última viagem de Lula a Roma foi em abril deste ano, para as cerimônias de despedida do Papa Francisco.
Confira também: crédito imobiliário
O encontro entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Papa Leão 14 reforça a importância das relações diplomáticas e os valores compartilhados em pautas cruciais como a justiça social, a paz mundial, a democracia e o cuidado com o meio ambiente. Este diálogo entre dois líderes de peso no cenário global sublinha o papel do Brasil na promoção de soluções para os desafios contemporâneos e a relevância de um diálogo contínuo. Continue acompanhando nossa editoria de Política para mais análises e notícias sobre os desdobramentos das relações internacionais do Brasil.
Crédito da imagem: Ricardo Stuckert/Presidência da República
Recomendo
🔗 Links Úteis
Recursos externos recomendados