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O conceito de infinito, eternamente enigmático e fundamental em diversas áreas do conhecimento, tem sido alvo de um intenso questionamento por parte de uma corrente crescente de cientistas. A discussão, impulsionada por matemáticos e filósofos, propõe a revisão e até mesmo a erradicação dessa noção, vista como uma “ilusão” que desnecessariamente complica a matemática e outras ciências. Essa controvérsia tem provocado debates sobre a verdadeira natureza dos números e a abrangência da realidade. Histórica e culturalmente presente desde a antiga Grécia até a cultura popular com frases como “Ao infinito e além!”, a ideia do ilimitado agora enfrenta seus próprios limites.
A atenção sobre o enigma do infinito é um legado que remonta à Antiguidade Clássica. Figuras como Zenão de Eleia, por volta de 490 a.C. a 430 a.C., desafiavam a compreensão com paradoxos envolvendo o movimento e a continuidade. Arquimedes de Siracusa, aproximadamente entre 287 a.C. e 212 a.C., aprofundou-se no conceito, somando infinitas parcelas para resolver problemas geométricos, pavimentando o caminho para o cálculo infinitesimal. Séculos mais tarde, no século 17, Isaac Newton (1643-1727) e Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) desenvolveram e formalizaram o cálculo, uma área da matemática essencial para o estudo de mudanças.
Matemáticos Propõem o Fim do Infinito: Por Quê?
Contemporaneamente, a matemática alemã Georg Cantor (1845-1918), nascido na Rússia, marcou a compreensão moderna do tema ao demonstrar, através de sua notável teoria dos conjuntos, que o infinito não é único, mas que existem diversos tipos de infinitos, e alguns são inclusive maiores que outros. Desde então, o conceito de infinito consolidou-se como um pilar da matemática e da física contemporânea, permeando o desenvolvimento da ciência e tecnologia em nosso dia a dia. Mas, de onde surgiu o desejo de alguns matemáticos em tentar destruir o infinito?
O professor Doron Zeilberger, da Universidade Rutgers em Nova Jérsei, Estados Unidos, é uma voz proeminente nessa discussão. Conhecido por ser um ultrafinitista, grupo de matemáticos, filósofos, cientistas da computação e físicos inicialmente considerados radicais, Zeilberger declara abertamente: “O infinito não é mais do que uma ilusão”. Para esses dissidentes, que apesar de reduzida, agora têm sua argumentação ouvida, números finitos, mesmo que colossais como 10⁹⁰ (maior do que o número de átomos no universo observável), podem ser considerados insignificantes e fora de alcance prático. Questionam a utilidade de conceitos que ultrapassam a capacidade humana de processamento.
A filosofia ultrafinitista, defendida por Zeilberger, aponta que a matemática desviou-se ao adotar o infinito, uma crença tão falha quanto a antiga visão de uma Terra plana. Ele sugere que, embora o universo seja ilimitado (ou seja, podemos sempre seguir em frente), ele pode ser finito, comparando-o à superfície finita, mas sem bordas, do nosso planeta. Em sua perspectiva, a matemática clássica, apesar de não ser logicamente errônea, é desnecessariamente complexa e intrincada. A crença em um número natural máximo possível poderia, segundo ele, simplificar consideravelmente a disciplina.
A objeção mais comum contra a finitude dos números é a prova de que se um número máximo existe, ao somarmos um, criaríamos um número ainda maior, evidenciando a existência do infinito. Zeilberger, em uma elegante circularidade, propõe que essa soma nos faria retornar ao zero, analogamente a dar uma volta completa na Terra e voltar ao ponto de partida. Ele traça um paralelo com Albert Einstein (1879-1955), que demonstrou o limite de velocidade da luz. Zeilberger argumenta que, embora não saiba qual é esse “número maior” final, sua existência possibilitaria refazer toda a matemática de maneira muito mais simples, mesmo que a tarefa pareça tediosa.
Os ultrafinitistas, portanto, buscam uma solução radical: eliminar o infinito em favor de números “factíveis”, com o objetivo de descomplicar a ciência e torná-la mais aplicável e prática. A grande questão é: o que define um número como “factível”? Rohit Parikh, da Universidade da Cidade de Nova York, desenvolveu uma das primeiras teorias formais ultrafinitistas na década de 1970, introduzindo a ideia de “números factíveis” como aqueles conectados à atividade humana. Ele questiona se um número, que não pode ser nomeado, calculado, armazenado, transmitido ou individualizado de forma coerente sob restrições físicas, pode realmente existir como um objeto matemático.

Imagem: bbc.com
O número de Skewes, por exemplo, é um número tão vastamente grande que se presume ter mais dígitos do que o universo comportaria. Apesar de sua magnitude, foi útil por demonstrar até onde a matemática pode ir em busca da certeza, validando resultados mesmo que impraticáveis. Essa natureza o colocaria acima do limite proposto pelos ultrafinitistas. Uma anedota contada por Harvey Friedman sobre Alexander Esenin-Volpin (1924-2016), um pai do ultrafinitismo moderno, ilustra essa ideia: ao questioná-lo sobre a “realidade” de 2¹⁰⁰, Esenin-Volpin demonstrava hesitação crescente com o aumento dos expoentes, evidenciando que a existência percebida dos números diminui à medida que eles crescem exponencialmente.
Na visão ultrafinitista, a aritmética é reajustada para ser viável, limitada pelo tempo, espaço e recursos. Computadores modernos, que executam cálculos inimagináveis para os antigos matemáticos, ajudam a estabelecer essa fronteira. A utilidade é o critério principal; se uma equação é muito complexa, aproximações obtidas por computadores são suficientes para propósitos práticos. De fato, grande parte do trabalho matemático contemporâneo já opera em limites finitos, como a criptografia e algoritmos complexos. Na física, teóricos como Max Tegmark, veem o infinito como um conceito belo, mas que atrapalha a compreensão física do universo, defendendo que nossas simulações mais precisas utilizam apenas recursos finitos.
Contudo, a dúvida persiste: limitar a matemática e a física à capacidade finita dos computadores não reprimiria a sabedoria e a exploração intelectual? A retirada do infinito da matemática poderia restringir a imaginação e a criatividade humana? Doron Zeilberger, apesar de entender o fascínio pelo infinito, reitera que há meios para redefinir a matemática de forma completamente finitista, ao menos o que é essencial para o avanço da ciência e tecnologia. Em última análise, a adoção do ultrafinitismo é quase uma questão de convicção. Para seus defensores, o infinito pode ou não existir, assim como outras concepções abstratas, mas não é estritamente necessário para os alicerces da matemática funcional.
Este debate instigante sobre o infinito desafia séculos de pensamento matemático e científico. Compreender os argumentos dos ultrafinitistas pode oferecer uma nova perspectiva sobre a natureza dos números e o propósito da pesquisa matemática. Para aprofundar-se em outros temas que moldam o futuro do conhecimento, explore nossa seção de análises em nosso portal. Continue nos acompanhando para mais conteúdos que estimulam o pensamento e a curiosidade.
Crédito: Getty Images
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