PCC Mira o Controle de Portos Estratégicos no Brasil

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Um grupo empresarial está sob investigação por suspeita de atuar como braço logístico da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), buscando expandir o PCC mira o controle de portos estratégicos na costa brasileira. A BBC News Brasil revelou que o conglomerado assumiu a gestão de um terminal portuário e manifestou interesse em operar outros dois, localizados em regiões cruciais para o comércio nacional.

A concretização total dessas iniciativas, que se estenderiam por até 25 anos, movimentaria uma cifra estimada em, no mínimo, R$ 3 bilhões. As operações envolvem a Stronghold Infra Investimentos, empresa associada ao Grupo BSO, que já detém controle sobre um terminal no porto de Paranaguá, no Paraná, e demonstrou intenção de operar em Maceió (Alagoas) e no porto de Santos, em São Paulo, considerado o mais movimentado do Brasil.

PCC Mira o Controle de Portos Estratégicos no Brasil

O Grupo BSO, sediado na prestigiada Avenida Faria Lima, o centro financeiro de São Paulo, foi um dos alvos da Operação Carbono Oculto, que desarticulou uma ramificação do PCC no segmento de combustíveis. Investigadores, que se pronunciaram em caráter reservado, indicam que a tentativa da facção de dominar terminais portuários visaria aprimorar tanto suas atividades no tráfico de drogas quanto no lucrativo setor de combustíveis.

O Grupo BSO e Suas Ambições Portuárias

O Grupo BSO, fundado em 2002, opera formalmente como um conglomerado diversificado, com atuações nos segmentos de cartões de crédito, empréstimo consignado e combustíveis. A estruturação do grupo teve como ponto central o Zeus Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios, a partir do qual foi estabelecida uma robusta estrutura empresarial para participar de leilões de concessão de portos. Em 2022, a Stronghold Infra Investments foi criada, vinculada ao Grupo BSO, e em 2023, começou a atuar ativamente nos leilões para o arrendamento de terminais dedicados à importação e exportação de combustíveis.

Documentos referentes à Operação Carbono Oculto evidenciam possíveis ligações entre dois dos sócios do Grupo BSO, Cleiton Santos Santana e Guilherme Ali de Paula, e Mohamad Houssein Mourad, apelidado de “Primo”, considerado pelas autoridades como o principal articulador do esquema do PCC no setor de combustíveis. Um trecho da decisão judicial de São Paulo, que autorizou a Operação Carbono Oculto, afirma que “apesar de Cleiton e seu sócio Guilherme Alide Paula ‘estamparem’ a fachada do grupo BSO, uma análise mais aprofundada revela vínculos diretos com o grupo Mohamad. Isso sugere que eles podem atuar como interpostas pessoas ou ter um papel mais profundo nas operações de ocultação de bens.” A mesma decisão judicial também pontua que “há elementos indicativos da expansão do grupo Mohamad para os portos, com os investimentos na cadeia de combustíveis sendo um dos destaques do Grupo BSO.” Tanto Cleiton quanto Guilherme foram alvo de mandados de busca e apreensão. Mourad, por sua vez, está foragido e tem mandado de prisão em aberto.

O Grupo BSO foi procurado e confirmou as investidas para obter controle de portos na costa brasileira, porém refuta categoricamente qualquer ligação com o PCC. Daniel Bialski, advogado de Cleiton Santos Santana, negou qualquer vínculo de seu cliente com a facção, argumentando não ter tido acesso integral à investigação e afirmando que, “ao que tomei conhecimento até agora, não há nada que vincule [o cliente dele] ou as empresas aos principais personagens da investigação”. As defesas de Guilherme Ali de Paula e Mohamad Houssein Mourad não foram localizadas para comentários.

As Três Tentativas de Arrendamento de Terminais Portuários

As tentativas do Grupo BSO para assumir terminais portuários ocorreram em diferentes momentos e locais estratégicos do país, conforme detalhado em documentos aos quais a BBC News Brasil teve acesso:

  1. Maceió (Agosto de 2023): A primeira empreitada ocorreu em agosto de 2023, quando a Stronghold participou de um leilão para arrendar o terminal MAC 12, no Porto de Maceió, em Alagoas. Este terminal, com 13 mil metros quadrados, é considerado de localização estratégica na costa nordestina, por estar a milhares de quilômetros mais próximo de mercados produtores de derivados de petróleo como os Estados Unidos, o Golfo Pérsico e a Rússia, em comparação com os terminais tradicionais das regiões Sudeste e Sul. A Stronghold, contudo, não obteve sucesso na disputa, sendo superada pela Ipiranga, empresa que integra o Grupo Ultra.
  2. Santos (Março de 2024): Em março de 2024, o Grupo Stronghold buscou novamente arrendar um terminal portuário, participando de um chamamento público relacionado ao leilão do terminal STS-08, no Porto de Santos, litoral de São Paulo. Esta fase de chamamento permite que as empresas manifestem interesse em participar de um futuro leilão, cuja data ainda não foi divulgada. Estima-se que o vencedor do processo deverá investir no mínimo R$ 452 milhões e que o contrato gere uma receita de cerca de R$ 2,8 bilhões, com duração prevista de 25 anos. O STS-08 é substancialmente maior que o terminal de Maceió, com 152 mil metros quadrados de área, e possui conexões dutoviárias com o terminal de Cubatão e refinarias localizadas em São Paulo, o maior mercado consumidor do país.
  3. Paranaguá (Julho de 2024): Quatro meses após a tentativa em Santos, em julho de 2024, a Stronghold alcançou sua primeira aquisição de terminal portuário. A empresa comprou a Liquipar, que havia vencido o leilão do terminal PAR-50, localizado no porto de Paranaguá, em 2023. Com 85 mil metros quadrados e 18 tanques de armazenagem, o terminal ainda não se encontra em operação. O contrato de arrendamento prevê que a gestão do terminal permanecerá com a empresa até o ano de 2051 e estipula que a Liquipar/Stronghold deverá repassar ao governo paranaense um total de R$ 1,7 bilhão até o término de sua vigência, além de comprometer-se a investir R$ 572 milhões na modernização das instalações. A publicidade sobre os investimentos no terminal foi feita por Cleiton Santos Santana, sócio do Grupo BSO, ao lado do governador do Paraná, Ratinho Jr (PSD), que figura entre os cotados para a disputa presidencial de 2026.

Questionados, tanto o Governo do Paraná quanto a empresa pública Portos do Paraná, responsável pela administração do porto de Paranaguá, negaram qualquer irregularidade no processo de concessão do controle do terminal PAR50 à Liquipar/Stronghold. Em nota, a Portos do Paraná esclareceu que “o leilão público de arrendamento do PAR50 foi realizado em 2023 na B3 de maneira transparente e a empresa vencedora foi a FTS Group, um grupo paranaense. Na sequência, esse grupo vendeu a concessão para outra empresa, num processo que foi feito no âmbito da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, do governo federal, sem qualquer ingerência do Estado.” O Governo do Paraná também “repudia qualquer tentativa de associar a administração estadual a essas investigações”.

Vínculos Apontados e Negativas

As investigações sugerem que Mohamad Mourad possa ter financiado, ao menos parcialmente, a aquisição da Liquipar pela Stronghold. Este financiamento teria ocorrido através de repasses da SM Serviços, identificada como uma empresa de fachada de Mourad, para a Grand Bank, companhia ligada a Guilherme Ali de Paula, em datas próximas às negociações para a compra da Liquipar. A decisão judicial de São Paulo destaca: “Guilherme Ali de Paula é o proprietário da GRAND BANK, que recebeu um alto fluxo financeiro da SM SERVIÇOS EMPRESARIAIS EIRELI em datas próximas à aquisição do terminal PAR 50 do Porto de Paranaguá”. Além disso, a investigação indica que Mourad teria conexão com a Stronghold via um fundo de investimentos: “Há uma suspeita de que o grupo Mohamad seja titular de 67% das cotas do FUNDO ATENA, o que estabeleceria um vínculo direto com o Porto de Paranaguá/PR”.

PCC Mira o Controle de Portos Estratégicos no Brasil - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

Em comunicado, a assessoria do Grupo BSO negou quaisquer supostos vínculos com o PCC. “Nem a Stronghold, nem a Zeus, nem a Liquipar têm qualquer vínculo societário ou relação de investimento com o sr. Mourad ou com a SM Serviços Empresariais”, afirmou a empresa. A Liquipar também negou irregularidades, por meio de nota, ressaltando que “a Liquipar atua com absoluta transparência e está à disposição das autoridades para cooperar com as investigações, prestando todos os esclarecimentos necessários, em coerência com seu compromisso com a legalidade, a segurança e o desenvolvimento do Porto de Paranaguá”.

As Implicações e Respostas à Ação Criminosa

Nívio Nascimento, assessor internacional e pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), manifestou surpresa e preocupação com a descoberta da intenção do PCC de controlar formalmente portos brasileiros. Para ele, “isso é escandaloso. É algo que não deveria acontecer. Ter uma organização como o PCC controlando um porto inteiro demonstra o poder dessas organizações e a necessidade de responder a esse problema à altura”. O pesquisador, que atuou entre 2008 e 2023 no Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), ressaltou o caráter estratégico desses portos para facções, que podem utilizá-los para atividades relacionadas a combustíveis e tráfico de drogas, destacando a utilização de fundos de investimento para a aquisição no porto de Paranaguá como algo inesperado. Ele, contudo, vê na Operação Carbono Oculto um “sinal governamental de que esse combate ao crime organizado está sendo feito” de maneira eficaz, por meio da “atuação integrada de diversos atores da segurança pública mirando os ativos das facções”. Para mais informações sobre as estratégias de combate ao crime organizado no Brasil, você pode consultar fontes como o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

A BBC News Brasil encaminhou questionamentos à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e ao Ministério de Portos e Aeroportos (MPOR) sobre o controle do terminal PAR50 pela Liquipar em Paranaguá, mas não obteve respostas. A Autoridade Portuária do Porto de Paranaguá (APPA), por e-mail, informou não ter sido oficialmente notificada sobre as investigações, acompanhando o caso pela imprensa, e indicou que só após a conclusão do processo ou solicitação das autoridades competentes, a empresa adotará as medidas administrativas cabíveis.

A Estrutura do Esquema Criminiso Revelada pelas Operações

Em 28 de agosto, três operações – Carbono Oculto, Quasar e Tank – foram deflagradas simultaneamente pela Polícia Federal, Receita Federal e Ministério Público de São Paulo (MPSP) para combater um esquema que o PCC teria utilizado para obter lucro com o comércio de combustível e para lavar e proteger seu patrimônio através do sistema financeiro. O Ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, classificou a ação como o maior golpe do Estado contra uma organização criminosa já realizado no país. Segundo as autoridades, o esquema empregava fundos de investimentos e empresas financeiras sediadas na Avenida Faria Lima, utilizando-as para gerar, lavar, ocultar e proteger os recursos provenientes das atividades de tráfico de drogas e do setor de combustíveis da facção. O PCC é reconhecido como uma das maiores organizações criminosas do Brasil, com atuações abrangentes.

O esquema principal, alvo da Operação Carbono Oculto, operava em quatro fases distintas:

  1. Importação e Distribuição Ilegal: Importadoras de combustíveis, financiadas com verbas da facção, adquiriam carregamentos no exterior. O produto era então distribuído a uma rede de aproximadamente mil postos de gasolina controlados pelo PCC, espalhados por dez estados: São Paulo, Bahia, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Maranhão, Piauí, Rio de Janeiro e Tocantins. Estes postos, por sua vez, sonegavam impostos na venda do produto final ao consumidor.
  2. Lavagem de Dinheiro do Tráfico: Nesta etapa, o PCC utilizava os mesmos postos de gasolina e outros estabelecimentos comerciais para realizar a lavagem de dinheiro obtido através do tráfico de drogas.
  3. Ocultação de Recursos Ilícitos: A ocultação dos fundos gerados ilicitamente contava com a participação de fintechs (empresas de tecnologia financeira). As investigações indicam que essas empresas receberiam recursos dos estabelecimentos sob controle do PCC e os misturariam com dinheiro de outros clientes, tornando extremamente complexo o rastreamento das transações.
  4. Blindagem Patrimonial: A fase final consistia na blindagem do patrimônio da facção contra futuras investigações. Esta proteção patrimonial era alcançada através de investimentos em fundos que eram, oficialmente, geridos por empresas localizadas no coração financeiro de São Paulo. De acordo com os investigadores, 40 fundos de investimentos, com um patrimônio conjunto de R$ 30 bilhões, estariam ligados a esse esquema e seriam, na verdade, controlados pela organização criminosa.

As operações resultaram em decretos de prisão para 14 pessoas, embora apenas seis tenham sido efetivamente presas. A Polícia Federal iniciou uma investigação paralela para apurar a suspeita de um possível vazamento de informações sobre a operação, o que poderia ter beneficiado os investigados.

Este cenário de avanço do crime organizado nos setores econômicos levanta questões importantes sobre segurança e a integridade de setores estratégicos do Brasil. Para aprofundar-se em análises sobre segurança pública e criminalidade organizada, visite nossa seção de Política em Hora de Começar, onde abordamos os desafios e as estratégias de enfrentamento desses problemas. Fique conosco para mais informações e notícias exclusivas.

Crédito, Roberto Dziura/Governo do Estado do Paraná


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