Proteção Povos Isolados Amazônia: Luta Por Existência

noticias
Artigos Relacionados

📚 Continue Lendo

Mais artigos do nosso blog

A proteção de povos isolados da Amazônia é uma realidade repleta de tensões e desafios, especialmente na floresta peruana, onde o encontro entre diferentes culturas pode ser abrupto e perigoso. Tomaz Anez Dos Santos, um morador de Nova Oceania, uma pequena comunidade à beira do rio Tauhamanu, vivenciou isso ao ser confrontado por integrantes do povo Mashco Piro em uma clareira. Segundo Santos, a surpresa do encontro o deixou paralisado quando um dos indígenas apontou uma flecha, motivando sua fuga imediata. Este incidente reflete a constante proximidade e o isolamento forçado de comunidades indígenas, que preferem não ter contato com o mundo exterior por mais de um século, conforme seu estilo de vida.

Os Mashco Piro são conhecidos por sua subsistência integral dependente da Amazônia, caçando com arcos e flechas. A narrativa de Tomaz Santos detalha um dos encontros tensos, onde a imitação de sons de animais por parte dos Mashco Piro, em conjunto com gritos e assobios, indicava uma tentativa de cerco. O temor dos moradores locais é palpável, especialmente considerando a vulnerabilidade e o instinto protetor dos Mashco Piro, que reagem à percepção de ameaça à sua floresta e seu modo de vida.

Proteção Povos Isolados Amazônia: Luta Por Existência

A convivência de longa data entre o povoado de Nova Oceania e os Mashco Piro, que por décadas evitou interações, está em constante transformação. Um relatório da Survival International, uma renomada organização de direitos humanos, revela que há pelo menos 196 “grupos não contatados” globalmente, com os Mashco Piro sendo possivelmente o maior deles. O documento alerta para um futuro sombrio, indicando que a metade desses grupos pode desaparecer na próxima década se não houver mais esforços governamentais para sua proteção.

Ameaças Crescentes e a Vulnerabilidade Extrema

Os principais vetores de risco para os povos indígenas isolados, segundo o relatório, incluem a exploração desenfreada de madeira, minérios e petróleo. Além das ameaças ambientais, a vulnerabilidade a doenças básicas é um fator crítico. Missionários evangelizadores e influenciadores digitais em busca de visibilidade também representam ameaças culturais significativas, capazes de perturbar o delicado equilíbrio das comunidades.

A situação na Amazônia peruana ilustra bem essas preocupações. Moradores de Nova Oceania relatam uma frequência crescente de contato com os Mashco Piro. Localizada a dez horas de barco do assentamento mais próximo, a vila de pescadores está em uma área desprotegida legalmente, onde madeireiras operam livremente. O barulho contínuo dos equipamentos é um lembrete constante da destruição da floresta que serve de lar e sustento para os povos indígenas.

Os sentimentos na comunidade são conflitantes: existe um temor das flechas dos Mashco Piro, mas também um profundo respeito e o desejo de protegê-los, referindo-se a eles como “irmãos”. “Deixem os Mashco Piro viverem como vivem, nós não podemos mudar a cultura deles. É por isso que nos mantemos distantes”, declara Tomaz Santos, encapsulando o dilema.

Aumento da Violência e Medo Recente

A apreensão dos moradores de Nova Oceania é intensificada pelos perigos tangíveis. A destruição do habitat natural dos Mashco Piro afeta diretamente sua subsistência, elevando a possibilidade de confrontos e o risco de exposição a doenças para as quais não possuem imunidade. Letitia Rodriguez Lopez, mãe de uma menina de dois anos, descreveu à BBC o susto ao ouvir “gritos, choros de pessoas” enquanto colhia frutas na floresta, fugindo com o coração acelerado pelo medo. A percepção é que o desmatamento impulsiona os Mashco Piro para mais perto das comunidades vizinhas, gerando uma incerteza sobre como eles reagirão.

O perigo não é apenas hipotético. Em 2022, um ataque do povo Mashco Piro resultou em mortes. Dois madeireiros foram surpreendidos enquanto pescavam, um atingido no estômago por uma flecha, o outro encontrado dias depois com nove ferimentos e sem vida. Incidentes como este sublinham a seriedade dos encontros não previstos.

Política de Não Contato e seus Precedentes Históricos

O governo peruano adota uma política rigorosa de não contato com povos isolados, criminalizando qualquer interação com esses grupos. Essa diretriz tem raízes históricas no Brasil, resultado de campanhas de grupos de defesa dos direitos indígenas após experiências trágicas em que o contato externo dizimou populações inteiras por meio de doenças, pobreza e desnutrição.

As consequências históricas são severas. Na década de 1980, o contato inicial do povo Nahau, no Peru, com o mundo exterior levou à morte de 50% de sua população em poucos anos. O povo Muruhanua enfrentou um destino similar na década de 1990. Issrail Aquisse, membro do grupo de defesa dos direitos indígenas Femanad, reitera a extrema vulnerabilidade desses povos. “Epidemiologicamente, qualquer contato pode transmitir doenças, e mesmo as consideradas mais triviais podem dizimá-los”, afirma. Ele destaca também o impacto cultural devastador que qualquer interferência pode causar.

Convivência em Clareiras: Um Delicado Equilíbrio

A complexidade de não ter contato se choca com a realidade de viver lado a lado. Em Nova Oceania, a vida se molda em torno dessa delicada vizinhança. Santos, ao guiar a BBC por uma clareira, demonstra a cautela, assobiando para verificar se há resposta dos Mashco Piro. Quando há silêncio, significa que estão ausentes. Os moradores têm cultivado alimentos, como bananas, para deixar em locais estratégicos como uma medida de proteção e oferta pacífica. “Eu gostaria de saber falar: ‘Aqui estão algumas bananas, é um presente, podem levá-las. Não atire em mim'”, confessa Santos, expondo a profunda insegurança da situação.

Os residentes de Nova Oceania sentem-se desamparados, percebendo que o governo não oferece apoio suficiente para mediar essa coexistência tensa. A Survival International tem constantemente alertado sobre a importância de políticas de não contato para a sobrevivência de comunidades indígenas em isolamento voluntário.

Proteção Povos Isolados Amazônia: Luta Por Existência - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

O Posto de Controle Nomole: Um Exemplo de Proteção Organizada

Contrastando com a situação em Nova Oceania, cerca de 200 km a sudeste, existe um modelo de interação mais organizado. Nas margens do rio Manu, os Mashco Piro vivem em uma área designada como reserva florestal. Lá, o Ministério da Cultura do Peru, em parceria com a Federação Nativa do Rio Madre de Dios e Afluentes (Fenamad), opera o posto de controle ‘Nomole’. Criado em 2013, após conflitos fatais entre os Mashco Piro e comunidades vizinhas, o posto busca evitar novas tragédias.

Antonio Trigoso Ydalgo, chefe do posto, relata aparições frequentes dos Mashco Piro, às vezes várias vezes por semana. Estes, um grupo distinto do de Nova Oceania, gritam seus pedidos por alimentos – bananas, mandioca ou cana-de-açúcar – de uma pequena praia de cascalho. Os agentes, para evitar chamar a atenção de turistas, geralmente atendem aos pedidos, cultivando parte dos alimentos e buscando o restante em comunidades próximas. Esta abordagem tem resultado em uma notável redução de conflitos.

Cerca de 40 indivíduos, incluindo famílias, são observados regularmente no posto. Eles usam nomes de animais e, embora não demonstrem interesse no mundo externo, mostram curiosidade pela vida pessoal dos agentes, suas famílias e moradias. Um gesto marcante foi a entrega de um chocalho de traqueia de macaco para o bebê de uma agente que saiu de licença-maternidade, indicando um laço incomum e pessoal. Eles também se interessam pelas vestimentas dos agentes, o que leva à estratégia de usar roupas velhas para evitar que sejam levadas. Eduardo Pancho Pisarlo, outro agente, observa uma mudança nas vestes: antes usavam indumentárias tradicionais belíssimas, agora alguns já aceitam roupas de turistas.

Mistérios e o Futuro Incerto

Apesar de anos de contato, os agentes no posto Nomole admitem saber pouco sobre o dia a dia e o modo de vida dos Mashco Piro na floresta. Suas conversas se encerram abruptamente quando o tema da vida na mata é abordado. “Uma vez, eu perguntei como eles acendem suas tochas. Eles me falaram: ‘Você tem madeira, você sabe’. Eu insisti, e eles disseram ‘Você já tem todas essas coisas, então por que quer saber?'”, relembra Ydalgo.

A ausência prolongada de um membro do grupo é interpretada por um lacônico “Não pergunte”, sinal de falecimento. Acredita-se que os Mashco Piro são descendentes de povos indígenas que buscaram refúgio na densidade da floresta no final do século XIX, escapando da exploração brutal e massacres perpetrados pelos “barões da borracha”. Especialistas os consideram próximos dos Yine, compartilhando um antigo dialeto. Contudo, os Mashco Piro parecem ter abandonado práticas agrícolas e de navegação fluvial, adaptando-se a um estilo de vida nômade de caçadores-coletores para se protegerem.

Issrail Aquisse, da Fenamad, destaca que mais de cem indivíduos foram vistos em postos de controle. Eles pedem alimentos para diversificar a dieta, mas podem desaparecer por meses ou anos. A ameaça se renova com a construção de uma rodovia que ligará essa área à mineração ilegal. Mesmo com os riscos, a experiência no posto revela que os Mashco Piro não buscam a integração. “Da minha experiência aqui no posto, eles não querem se tornar ‘civilizados'”, afirma Ydalgo. Ele pondera que talvez as crianças demonstrem interesse em vinte anos, mas os adultos buscam apenas que a presença externa seja minimizada.

Um projeto de 2016 para ampliar a reserva dos Mashco Piro, abrangendo Nova Oceania, nunca foi implementado, deixando a comunidade em um limbo de insegurança e responsabilidade pela proteção de seus vizinhos isolados. “Eles precisam ser livres como nós”, clama Santos, que entende o fim das florestas como o fim de um modo de vida pacífico que durou por muitos anos.

Confira também: crédito imobiliário

Este artigo detalha a situação crítica enfrentada pelos povos isolados na Amazônia peruana, os riscos decorrentes da exploração ambiental e os desafios de coexistência. A proteção dos Mashco Piro e outros grupos similares demanda atenção urgente e a implementação de políticas eficazes para garantir seu futuro. Para aprofundar-se em questões socioculturais e ambientais da região, explore nossa editoria de Análises.

Crédito da imagem: Fenamad, Google/BBC, Survival International


Links Externos

🔗 Links Úteis

Recursos externos recomendados