Trump e o Poder de Retaliação Contra Adversários Políticos

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Nove meses após seu retorno à Casa Branca, o presidente Donald Trump consolida as promessas de retaliação sem precedentes contra aqueles que ele categoriza como adversários. O espectro dessas ações se manifesta de forma cada vez mais clara e, segundo analistas, com uma ousadia marcante que desafia padrões históricos.

A promessa inicial de agir contra oponentes políticos, formulada antes mesmo de sua posse, agora se concretiza através de diversas frentes, demonstrando uma expansão acentuada do uso do poder executivo para influenciar o cenário político e judicial do país.

Trump e o Poder de Retaliação Contra Adversários Políticos

Desde que reassumiu a presidência, Trump instruiu publicamente sua procuradora-geral a investigar adversários políticos e sugeriu a possibilidade de o governo revogar concessões de emissoras de televisão que ele considera tendenciosas. Ele também atuou diretamente contra escritórios de advocacia que foram identificados como críticos, retirando contratos e acessos governamentais a autorizações de segurança, em uma série de medidas conduzidas com um fervor (ou descaramento, na visão de seus oponentes) que subestima a gravidade e a anomalia dessas atitudes. Meio século atrás, uma medida similar, quando o então presidente Richard Nixon discutia em particular a necessidade de processar adversários políticos, desencadeou um clamor bipartidário que culminaria em sua renúncia, um evento crucial na história política dos EUA, como documentos da presidência americana evidenciam. Contudo, em 2024, atitudes comparáveis são apenas breves notas no conturbado noticiário semanal, com o ritmo de ampliação da autoridade presidencial para impor sua vontade em franco aceleramento.

Ampliação da Autoridade e Investigações Visadas

No dia 25 de setembro, Donald Trump assinou uma ordem executiva focada em “terrorismo doméstico e violência política”, declarando que a medida seria empregada para investigar “indivíduos de grande fortuna” que supostamente financiam “agitadores e anarquistas profissionais”. Entre os nomes mencionados por Trump como potenciais alvos destas investigações, estavam o bilionário George Soros e o fundador do LinkedIn, Reid Hoffman. Horas após o anúncio, o Departamento de Justiça, sob sua administração, revelou o indiciamento de James Comey, ex-diretor do FBI e um notório crítico do presidente, a quem Trump havia categorizado dias antes como “culpado como o diabo” em declarações públicas.

Justificativas Presidenciais e a Visão MAGA

Trump justificou a pressão sobre grupos de esquerda ao citar dois episódios violentos recentes: o falecimento do ativista conservador Charlie Kirk (nascido em 1993 e falecido em 2025) em um campus universitário e um ataque armado contra agentes de imigração em Dallas, Texas, que resultou em dois migrantes feridos e um morto. O presidente argumenta que essa abrangente série de ações é imperativa e urgente. Para ele, as investigações contra adversários políticos visam infratores da lei e membros de um “estado profundo” que teria obstruído seu primeiro mandato. A grande imprensa, segundo a perspectiva de sua coalizão MAGA, deveria ser responsabilizada pela alegada parcialidade e por disseminar “notícias falsas”. Além disso, Trump defende que empresas privadas que, segundo ele, foram prejudicadas por políticas de diversidade e corrupção política, necessitam da intervenção governamental para retificar seu curso. Ele e seus apoiadores também atribuem ao governo Biden a culpa por qualquer eventual descumprimento de normas por parte do atual presidente.

Trump x Biden: Uma História de Ações Presidenciais

Uma análise das ações de diferentes administrações revela contrastes marcantes no exercício do poder. Durante os quatro anos do mandato democrata de Joe Biden, Donald Trump enfrentou quatro indiciamentos e uma condenação judicial. Adicionalmente, vários de seus aliados mais próximos foram processados e presos por desacato ao Congresso americano, incluindo figuras como Steve Bannon, seu ex-chefe de campanha em 2016, e Peter Navarro, seu conselheiro comercial. Outros foram indiciados por sua suposta participação em esforços para reverter os resultados da eleição presidencial de 2020. No governo Biden, a Casa Branca orientou empresas de redes sociais a restringir o que era considerado discurso de ódio durante a pandemia de covid-19. O então presidente também buscou ampliar seus poderes executivos para impulsionar sua agenda, que abrangia o perdão de dívidas estudantis, vacinação obrigatória, salvaguarda dos direitos de pessoas transgênero em escolas públicas e a implementação de regulamentações ambientais. Enquanto os apoiadores de Trump podem argumentar que a mudança de rumo é justificada, o contraste entre as ações de Biden e as do presidente atual é notável. Dos processos que Trump enfrentou, apenas duas foram conduzidos pelo governo federal, ambas iniciadas por um promotor especial independente do Departamento de Justiça de Joe Biden. Diferentemente de Trump, Biden manteve um perfil discreto sobre os procedimentos judiciais. Muitas das ordens executivas de Biden foram derrubadas pela Suprema Corte, a mesma corte que, até o momento, concedeu uma “carta branca” substancial para as operações de Trump.

Contexto Jurídico e Perseguição Perceptível

Entretanto, esses pormenores talvez tenham pouca importância para Donald Trump, que cultiva a imagem de uma figura perseguida. Essa narrativa tem sido fundamental para forjar uma conexão com grande parte de seus eleitores, que ecoam o mesmo sentimento de injustiça diante de um “establishment” que, segundo eles, os traiu. Trump também pode sentir-se menos cerceado neste segundo mandato, especialmente após a decisão da Suprema Corte no ano passado, que, em grande parte, isenta presidentes americanos, incluindo ele, de responsabilidade criminal por atos oficiais realizados. O debate sobre os poderes presidenciais e a natureza da “retribuição” sublinha uma divergência fundamental entre as visões de Biden e Trump acerca dos riscos existenciais que os Estados Unidos e o cenário global enfrentam. Muitos funcionários de alto escalão na Casa Branca de Trump partilham a convicção de que os EUA e, por extensão, a civilização ocidental, enfrentam uma ameaça grave da cultura esquerdista, da imigração em massa, do desequilíbrio do comércio global e de um governo abusivo. Stephen Miller, conselheiro de longa data de Trump, arquiteto de suas políticas de imigração e um de seus mais ardentes defensores, em um discurso inflamado durante o funeral do ativista conservador Charlie Kirk, enfatizou que o legado americano “remonta a Atenas, a Roma, à Filadélfia, a Monticello”, proclamando: “Vocês não têm ideia do tamanho da nossa determinação para salvar esta civilização. Para salvar o Ocidente, salvar esta república.”

Retrocesso Democrático e Críticas ao Autoritarismo

Essa visão contrasta vividamente com a delineada por Biden durante sua administração, na qual a luta primordial da era não se daria entre a civilização ocidental e as forças que a ameaçariam, mas entre nações democráticas e regimes autoritários. Em 2021, Biden afirmou: “Estamos em uma encruzilhada entre aqueles que defendem que a autocracia é o melhor caminho a seguir e os que entendem que a democracia é fundamental. Devemos demonstrar que as democracias ainda podem atender o nosso povo, neste mundo em transformação.” Atualmente, os críticos de Trump asseveram que o presidente americano não está meramente abdicando dessa batalha, mas, na verdade, conduzindo os Estados Unidos para uma trilha autoritária.

Trump e o Poder de Retaliação Contra Adversários Políticos - Imagem do artigo original

Imagem: bbc.com

As Pressões e Indiciamentos Mais Recentes

Para aqueles que interpretam Trump como um aspirante a autocrata, o indiciamento de James Comey é a mais recente prova de um presidente que reage a seus críticos com um impulso de acusação e retribuição pessoal. Nos dias que antecederam a formalização das acusações contra Comey por falsas declarações ao Congresso e obstrução da justiça, Trump solicitou à procuradora-geral Pam Bondi que iniciasse processos não apenas contra o ex-diretor do FBI, mas também contra a procuradora-geral de Nova York, Letitia James, e o senador pela Califórnia, Adam Schiff. O presidente os acusou de conspiração. Em sua veemente mensagem, ele declarou: “Não podemos esperar mais, está destruindo nossa reputação e credibilidade. Eles fizeram meu impeachment duas vezes e me indiciaram (5 vezes!) SEM MOTIVO. A JUSTIÇA DEVE SER FEITA, AGORA!!!” O promotor federal que estava conduzindo as investigações de Comey e James se demitiu em meio às pressões e foi subsequentemente substituído por uma ex-advogada pessoal de Trump, a quem se atribui a condução direta do caso de Comey ao grande júri, resultando em seu indiciamento. Em entrevista à BBC, Laurie Levenson, professora de Direito da Universidade Loyola Marymount, em Los Angeles, Califórnia, comentou: “Isso não tem precedentes, o presidente ter basicamente orientado seus funcionários a indiciar um indivíduo específico porque ele tem raiva daquela pessoa.” Outros críticos proeminentes da gestão presidencial também foram alvo de investigações. Em agosto, agentes federais realizaram uma busca na residência e no escritório de John Bolton, ex-conselheiro de segurança nacional de Trump, que se tornou um ferrenho crítico, como parte de um processo envolvendo o tratamento de documentos sigilosos. John Brennan, chefe da CIA durante o governo de Barack Obama, também estaria sob investigação.

Campanha Contra a Imprensa e Ameaças Legais

O presidente intensificou sua campanha contra os principais veículos de imprensa, alegando que eles o criticam excessivamente, em uma suposta violação da legislação federal. Trump processou os jornais The New York Times e The Wall Street Journal em valores bilionários, após já ter estabelecido acordos com as redes de TV ABC News e CBS News. Recentemente, alguns republicanos de destaque expressaram descontentamento quando, na semana anterior, Brendan Carr, chefe da Comissão Federal de Comunicações (FCC), conseguiu que emissoras locais parassem de transmitir um dos maiores programas humorísticos noturnos dos EUA, devido a comentários de seu apresentador Jimmy Kimmel sobre Charlie Kirk, o suspeito de seu assassinato e a forma como Trump lamentou a morte do ativista. O presidente, por sua vez, redobrou a aposta, afirmando que redes de TV que lhe oferecessem “publicidade negativa” poderiam ser processadas. Em meio a essa polêmica, o senador Ted Cruz, do Texas, equiparou as ameaças de Carr às táticas da máfia, enquanto seu colega Rand Paul, de Kentucky, as considerou “totalmente inadequadas.” Algumas vozes da esquerda vão ainda mais longe, estabelecendo sombrias comparações com a Alemanha da década de 1930. “Trump é o Hitler do nosso tempo” foi um dos cânticos entoados por manifestantes contrários ao presidente em um restaurante de Washington, em agosto, onde ele jantava com auxiliares. O senador Chris Van Hollen, de Maryland, declarou no final de setembro: “Qualquer pessoa que pense que estamos a caminho do autoritarismo está errada. Nós já estamos lá.”

Síndrome do Transtorno por Trump e as Comparações Históricas

O governo Trump refuta essas advertências, classificando-as não apenas como infundadas, mas como manifestações histéricas da chamada “síndrome de transtorno por Trump”. Eles traçam uma correlação direta entre essas críticas e os atos recentes de violência, como o falecimento de Charlie Kirk. “Se você quiser impedir a violência policial, pare de dizer aos seus apoiadores que todos os que discordam de você são nazistas”, declarou o vice-presidente J.D. Vance no final de setembro. Contudo, a questão do “retrocesso democrático” e se ele está de fato ocorrendo nos Estados Unidos não precisa se basear nos tensos debates sobre a ascensão do fascismo no século XX. O Instituto Variedades de Democracia, da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, conduz uma pesquisa anual sobre a governança global. Seu relatório revelou que 72% da população mundial vive atualmente sob autocracias, o nível mais elevado desde 1978. Em 2024, 45 países adotaram formas de governo mais autocráticas, incluindo nações como Hungria, Turquia, México, Grécia e Gana. Nesses países, padrões semelhantes foram observados: restrições à liberdade de expressão, processos eleitorais menos abertos, enfraquecimento do Estado de Direito e da independência judiciária, limitação da sociedade civil e da liberdade acadêmica. Governos ampliaram seu controle sobre instituições e indivíduos, não necessariamente com a mesma rapidez ou simultaneidade, mas com resultados semelhantes. O Instituto aponta que os Estados Unidos vêm exibindo tendências “preocupantes” similares, desenvolvendo-se a uma velocidade inédita na história moderna americana. O último relatório da organização, publicado em março, adverte: “Parecem estar em ação a expansão do Executivo, prejudicando o poder de controle do Congresso, ofensivas contra instituições independentes e regulatórias e contra a imprensa, além do expurgo e desmantelamento das instituições estatais, que são estratégias clássicas dos autocratas. O conveniente silêncio dos seus críticos, por medo de retaliação, também impera.”

A Promessa de ‘Retribuição’ de Trump

Em um comício em Waco, Texas, em 2023, enquanto se estabelecia como candidato à Casa Branca, Donald Trump especulou publicamente sobre sua iminente acusação em Nova York por fraude, ligada a pagamentos secretos à ex-atriz pornô Stormy Daniels antes das eleições de 2016. Essas acusações se materializaram cinco dias depois, culminando em sua condenação. Naquela tarde de calor escaldante, diante de uma multidão de aproximadamente 15 mil apoiadores fervorosos, Trump fez uma série de declarações contundentes. “Eu sou o seu guerreiro”, proclamou ele. “Eu sou a sua justiça. E, para aqueles que foram injustiçados e traídos, eu sou a sua retribuição.” O conceito de “retribuição” tornou-se um leitmotiv em sua campanha eleitoral durante o ano e meio subsequente. Por vezes, ele apresentava o “sucesso” como a própria retribuição. Em outras ocasiões, como em entrevistas concedidas após sua condenação em maio de 2024, sua postura foi mais assertiva. Ao psicólogo televisivo Dr. Phil, ele afirmou que “às vezes, a vingança pode ser justificada” e que “a vingança, de fato, leva tempo”. Em resposta a uma pergunta sobre retribuição feita pelo apresentador Sean Hannity, da Fox News, Trump declarou que tinha todo o direito de “perseguir” os democratas “com base no que eles fizeram”. Em 26 de setembro, Trump declarou que o indiciamento de Comey era uma “questão de justiça, não de vingança”, mas ressaltou sua expectativa de que “outros” seguissem o mesmo caminho. “Também é questão de que não se pode permitir que isso continue”, disse ele a um grupo de jornalistas na Casa Branca. “São pessoas doentes, radicais de esquerda, e você não pode deixar que eles saiam impunes.”

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As ações de Donald Trump, delineadas pela promessa de retribuição, têm moldado a paisagem política e jurídica dos Estados Unidos de maneira inédita. Sua estratégia de expandir o uso da autoridade presidencial contra adversários e instituições tem levantado debates acalorados sobre o futuro da democracia no país. Para se aprofundar nesse e em outros temas relevantes, continue acompanhando nossa editoria de Política e fique por dentro dos desdobramentos globais e nacionais.

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